domingo, 2 de fevereiro de 2014

TERCEIRO TRABALHO DE HÉRCULES



HESPÉRIDES
  
Os Pomos de Ouro dos Jardins das Hespérides - Quando de seu casamento (hierogamia) com Zeus, Hera recebeu da Grande-Mãe
ATLAS
Geia três maçãs (pomos) de ouro como presente. Achando-as tão belas, resolveu guardá-las num lugar especial, numa região que ficava nos confins do Ocidente, no chamado Jardim das Hespérides. As Hespérides eram as três filhas do titã Atlas, um gigante, irmão de Prometeu, que, perto do Jardim, sustentava a abóbada celeste nos seus ombros. Ele fora condenado pelos deuses olímpicos a sustentar para todo o sempre os céus para que eles não mais desabassem sobre a Terra.




  
As Hespérides eram três: Egle (A Brilhante), Eritia (A Vermelha) e Hesperaretusa (A do Poente), cada uma delas representando uma fase da caminhada do Sol nos céus, o nascente, o meio-dia e o entardecer. O jardim ficava também próximo da Ilha dos Bem-Aventurados e do país dos Cimérios (os que habitam as trevas). Hera mandou que os pomos fossem pendurados numa árvore do Jardim, mantidos sob severa vigilância para que ninguém os roubasse. Para tanto, um filho de Tifão e de Équidna, o dragão Ládon os vigiaria dia e noite. 

LADON E GEA
Hércules, neste seu terceiro trabalho, teria que se apoderar dos referidos pomos e entregá-los a Euristeu. Recebida a ordem, sem maiores informações sobre o local exato do Jardim, se ficava a leste ou oeste, ao norte ou ao sul, Hércules pôs-se a caminho, tomando a direção norte, da Macedônia. Ao atravessar as terras macedônicas,
SANTUÁRIO DE DELFOS, HOJE
o nosso herói foi desafiado por Cicno, filho do deus Ares, um violento e famoso salteador de estradas, que atacava principalmente os peregrinos que iam em direção do santuário de Delfos. A pedido de Apolo, Senhor do Oráculo, Hércules venceu o bandido em rápido combate, matando-o. Ares, irritado, investiu contra nosso herói, lançando um dardo mortal; socorrido por Palas Athena, desviado o dardo, Hércules, revidando, feriu-o na coxa, obrigando-o a se retirar às pressas para o Olimpo.

A primeira refrega de nosso herói neste terceiro trabalho, como se pode ver, nada tem de especial, nenhuma lição a ser retirada dele. É claro que Hércules sabia o que o oráculo de Apolo significava, pois a imposição dos seus doze trabalhos estava diretamente ligada a ele; foi de lá que saiu a determinação para que se apresentasse a Euristeu. Não há, porém, nos registros mitológicos nenhuma referência maior ao fato, mesmo naqueles de mitógrafos e escritores que mais discorreram sobre Hércules e sua vida: Apollodoro, Diodoro Sículo, Píndaro, Apollonio de Rodes, Eurípdes, Ferécides e outros.

O oráculo de Delfos entrou na vida de Hércules como sempre entrou na vida de todos os gregos: um lugar, um santuário ao qual se ia, desde reis, potentados e aristocratas a cidadãos comuns, inclusive estrangeiros e gente do povo, desde tempos muito remotos, pré-helênicos, quando havia “alguma coisa importante a se resolver”. Declarações de guerra, empreendimentos comerciais, aventuras coloniais, divergências políticas, problemas sociais (calamidades, pestes, cataclismos), questões familiares e pessoais, especialmente as de foro íntimo, que ficavam no âmbito da individualidade, de julgamento da própria consciência, de tudo ali se tratava. Todos acorriam a Delfos em busca de uma sentença oracular, de uma definição, de alguma forma de alívio. 

A PÍTIA
  Era por essas razões que Delfos sempre teve no mundo grego, principalmente no período clássico, uma grande importância, sendo o lugar  considerado como o mais sagrado da Grécia; para todos, não só para o homem comum, uma espécie de centro do globo terrestre, o umbigo do mundo, o omphalos. É de se lembrar que o templo de Apolo, que fazia a celebridade do lugar, era onde os ricos aristocratas guardavam em segredo o seu dinheiro, a sua fortuna, tudo devidamente acertado com a poderosa classe sacerdotal que administrava o grande santuário. Era nesse santo lugar que a pítia ou sibila, em transe, sentada num banco (tripé), proferia as suas sentenças oraculares, devidamente interpretadas pelos sacerdotes.

A morte de Cicno, nessa perspectiva, não passou de um favor de nosso herói prestado a Apolo, isto é, à classe sacerdotal, já que a ação do bandido vinha atrapalhando bastante os negócios do templo, afugentando os crentes. Se algo de positivo podemos retirar
HÉRCULES E OS CENTAUROS
do episódio, é que ele confirma que o melhor de nosso herói sempre esteve nos vários papéis que ele desempenhou como agente civilizador, desde construtor de cidades, de estradas e de barragens, de criador de agones (jogos esportivos, as olimpíadas), a caçador de arruaceiros (os centauros) e a matador de monstros e bandidos. E como se tudo isso não bastasse não podemos ignorar que Hércules foi o herói grego que maior descendência deixou, dentro e fora da Grécia. É nesse sentido o ancestral fundador de inúmeras famílias, honrado como tal em várias cidades até hoje.

Da Macedônia, Hércules, passando pela Ilíria, caminhou em direção do rio Erídano (para uns, o rio Pó, na Itália), procurando manter contacto com as ninfas que às suas margens viviam. Elas lhe revelaram que só o deus Nereu poderia dar informações precisas sobre a localização do Jardim das Hespérides. Encontrado, Nereu tentou escapar do herói de várias maneiras, metamorfoseando-se, como era seu costume, em touro, delfim e outros animais. Pressionado insistentemente por Hércules, que quase o estrangulou, o Velho do Mar, como era chamado, acabou por revelar que para chegar ao Jardim ele deveria ir em direção do ocidente.

NEREU
  Nereu (etimologicamente, o que vive no mar) é um velho deus marinho, anterior a Poseidon, distinguindo-se deste por seu temperamento pacífico, mostrando-se sempre justo e sábio. Era filho de Geia e de Pontos. Desposou a oceânida Dóris, com a qual
FONTE DAS NEREIDAS
teve cinquenta filhas, as famosas nereidas. Aparece sob a figura de um velho, entre as ondas espumantes. Seu império se confundia com os limites do mar Egeu, em cujas profundezas residia, numa iluminada gruta. Costumava sair dos seus domínios para se mostrar aos mortais e fazer profecias sobre o que os aguardava no futuro. Lembre-se que ele, além de outras profecias, advertiu o príncipe troiano Páris sobre a infelicidade que ameaçava a sua pátria se raptasse a rainha espartana Helena.

As profecias, como se sabe, têm lugar de destaque nas atribuições das divindades marinhas. Pelo seu caráter receptivo, informal, indiferenciado, mas dotado de virtudes prolíficas, a água, pelas inúmeras possibilidades que contém, é pura virtualidade. Nelas se guardam todas as possibilidades do devenir, do futuro. É por essa razão que os deuses do elemento líquido são hidromantes consumados, todos dotados de poderes proféticos que sempre lembram vida inconsciente; são representados por animais que encarnam o princípio da fecundidade, como o touro, o cavalo e o delfim. 

PROTEU (ANDREA ALCIATO-1531)
Um outro nome de Nereu parece ter sido Proteu (o que vem antes), como este aparece na Odisseia, também dotado do poder de se metamorfosear não só em animais como em água e em fogo. Possuía o dom da profecia, sendo considerado na tradição mítica como um símbolo do inconsciente que pode se manifestar de diversos modos. A partir de Heródoto, Proteu passou a ser mencionado como um faraó, contemporâneo dos átridas gregos, obrigado depois a fugir do país por um outro faraó, de nome Busíris. Nas extensas relações de nomes dos faraós do período dinástico, que sempre se publicaram, entretanto, nunca foram encontrados os nomes de Proteu e de Busíris. 

Saindo do mar, onde residia Nereu, Hércules passou pela Líbia, onde teve que se defrontar com o gigante Anteu, filho de Poseidon e de Geia. Venceu-o somente depois que o elevou ao ar, não permitindo que ele tocasse a terra, pois, toda vez em que ele assim o fazia, recuperava as suas forças, duplicando-as. Conseguiu, assim, Hércules, ao mantê-lo erguido, sem tocar o solo, que ele definhasse e morresse. Encantado pela beleza de Ifínoe, mulher de Anteu, uniu-se a ela, fazendo-lhe um filho que recebeu o nome de Palemon (etimologicamente, vencedor), em memória da vitória de Hércules sobre o gigante (etimologicamente, nascido da terra).

A luta de Hércules contra Anteu foi o inverso da luta habitual, pela qual o adversário era imobilizado com as costas voltadas para o
HÉRCULES X ANTEU
solo. Lembro que no séc. V, o escultor Lisipo popularizou a imagem de Hércules vencedor, erguendo Anteu. Essa imagem, desde então, passou a ser considerada como um símbolo da vitória contra inimigos em quaisquer tipos de lutas individuais ou batalhas. Mais tarde, os nomes de Ifínoe e de seu filho foram africanizados, passando ela a ser chamada de Tinge (epônimo de Tanger) e Palemon de Sophax, ancestral dos reis da Mauritânia, tudo como nos informa Ferécides de Siro em sua cosmogonia. 


Uma tribo de pigmeus que vivia por perto tentou vingar a morte de Anteu. Atacado por eles, Hércules, que estava adormecido, cansado da luta, acordou, vencendo-os facilmente. Esse episódio, lembremos, devidamente adaptado, foi parar em “As Viagens de Lemuel Gulliver”, do irlandês Jonathan Swift.

Como nos contam Apollodoro e Ferécides, Hércules prosseguiu, então, na sua viagem. Desorientando-se, acabou tomando a direção contrária do caminho que deveria seguir. Chegou ao Egito, então governado pelo rei Busíris, segundo nos informam alguns mitógrafos gregos. O país passava então por grandes problemas de abastecimento, colheitas más, fome. Para aplacar as divindades, faziam-se sacrifícios humanos, segundo os videntes aconselhavam.  Hércules foi aprisionado pelo rei para se tornar uma das vítimas sacrificiais. O nosso herói conseguiu, contudo, se libertar e matou Busíris.

O relato mais completo da passagem de Hércules pelo Egito está em Ferécides. Por ele, ficamos sabendo que Busiris era filho de Poseidon e de Lisianassa, esta filha de Épafo. Épafo, por sua vez era filho de Io, um dos grandes amores de Zeus. Fugindo de Hera, Io se refugiou no Egito e lá deu à luz o mencionado Épafo (etimologicamente, o tocado). Constam de vários mitos gregos informações de que, mais tarde, Io reinou no Egito sob o nome de Ísis, recebendo honras divinas. Épafo, por sua vez, casou-se com Mênfis, filha do deus-rio Hapi (Nilo) e com ela teve três filhas: Líbia (que deu nome ao país vizinho), Lisianassa (mãe de Busíris) e Tebe. 

IO - ISIS
  Evidentemente estas histórias montadas por mitógrafos, escritores e poetas gregos em torno de Io, Épafo, Busíris e Hércules tiveram a finalidade de resolver uma espécie do que chamo de complexo de inferioridade que os gregos sempre tiveram diante da civilização egípcia. Só para se ter uma pálida ideia do quanto o Egito impressionava os gregos, lembro de uma visita que Heródoto, grande historiador e viajante traquejado, fez ao país dos faraós no séc. V aC. Deslumbrado, afirmou: maravilhas mais numerosas do que as de qualquer outra terra e obras de inqualificável grandeza. Muitas vezes milenar, muito mais antiga que a civilização cretense, a civilização egípcia, quando o mundo grego começou a se formar com a chegada dos aqueus por volta de 2.000 aC, só de história documentada, de grandes realizações, já tinha quase 3.000 anos. Um esplendor que, apesar dos problemas internos e externos enfrentados, durou ainda mais 2.500 anos.

O parênteses que abro aqui para falar de Io, com a finalidade de se entender a inserção da passagem de Hércules pelo Egito, acho que se justifica à vista dos dados acima e a seguir expostos, que complementam de certa forma o que está no segundo trabalho de nosso herói. Os gregos sempre ligaram a história de Io à era de Touro (4.000-2.000 aC, mais ou menos), período em que no seu início o Egito se unificou, como sabemos. Io, no mito, era uma princesa argiva de beleza sem igual. Valendo-se dos préstimos de Oniro, um dos filhos de Hipnos, deus do sono, Zeus conseguiu fazer com que ela fosse transportada para Lerna, a fim de poder se unir a ela sexualmente. Nesse meio tempo, Hera, desconfiada dessa aventura extraconjugal de seu esposo, mais uma dentre inúmeras, preparou-se para destruí-la. Zeus agiu rapidamente, transformando a jovem numa novilha. Hera viu o animal, belíssimo, exigindo que ele lhe fosse entregue. Assim foi feito, sendo o animal colocado sob a vigilância do dragão Argos, o de Cem-Olhos. Zeus, contudo, escapando dessa vigilância, a visitava regularmente na forma de um imponente touro.

Certo dia, Zeus resolveu libertar Io-novilha do dragão, pedindo a Hermes que tomasse as providências cabíveis. Hermes, então, convocou Hipnos, determinando que ele adormecesse o dragão para que pudesse matá-lo, o que aconteceu. Hera, tomando conhecimento do fato, primeiro homenageou o dragão, lançando os seus cem olhos na cauda de uma bela ave. Desde então, essa ave passou a ser chamada de pavão, considerada um símbolo da senhora do Olimpo. Além disso, sua forma foi colocada nos céus como uma constelação (Pavo), situada entre 25º  Sagitário e 25º Capricórnio. 

ESTREITO DE BÓSFORO - PASSAGEM DA VACA
  Para punir Io-novilha, Hera enviou um gigantesco moscardo, que a enlouquecia com as suas ferroadas. Desesperada, ela fugiu, atravessando primeiro um mar que por essa razão passou a ser chamado de Jônico (Iônico). Depois, ela atravessou um estreito que separa a Europa da Ásia, razão pela qual tal acidente geográfico recebeu o nome de estreito de Bósforo (literalmente, passagem da vaca). Depois de vagar por toda a Ásia, Io-novilha chegou ao Egito, retomando a sua belíssima forma humana, que permanecera intacta. Lá, dará à luz um filho, o já citado Épafo. Adorada depois em todo o Egito como Ísis, adotará como seu emblema o crescente lunar. Segundo algumas versões gregas, Zeus a colocará nos céus (isto é, a sua forma) como a constelação de Touro. Ísis, como sabemos, será adorada como deusa suprema e universal, mãe da natureza e de todos os elementos, espalhando-se o seu culto a partir do Egito por todo o Mediterrâneo e Ásia Menor. 

BUSIRIS - DELTA DO NILO
 Quanto ao mais, registro aqui, conforme dados históricos disponíveis, o que há na realidade sobre este tópico. Busíris era o nome da capital do 9º nomo do Egito, situado na região do delta do Nilo, sendo a cidade conhecida como a “Morada de Osíris”. Nos tempos pré-dinásticos, a região era tutelada pelo deus Andjty, representado por um pastor que usava na cabeça uma espécie de turbante com duas plumas; carregava nas mãos um bastão, mais tarde transformado no heka, o cetro real. Aos poucos, o culto do primitivo deus-pastor foi desaparecendo, tornando-se Busíris no período dinástico a cidade-santa de Osíris e de Ísis.  

Do Egito, Hércules  segue em direção da Arábia. No caminho, mais uma terrível luta. Enfrentou Emátion, filho de Eos, a deusa das auroras, e de Títono; ele tentou impedir que Hércules continuasse
COLOSSOS DE MEMNON
sua viagem, pois queria chegar antes dele ao Jardim das Hespérides para se apoderar dos pomos de ouro. Nosso herói conseguiu matá-lo, entregando o reino de Emátion a seu irmão, Memnon, que morreria mais tarde num duelo que travou com Aquiles. Uma curiosidade: eram famosas no Egito as gigantescas estátuas que o faraó Amenófis III mandou esculpir em homenagem a Memnon. Perto de Tebas, havia uma delas, conhecida pelo nome de “Colosso de Memnon”.  Consta que a deusa Eos, quando da morte de seu filho Memnon, chorou tanto que as suas lágrimas transformaram-se em orvalho matutino, precipitação celeste até então inexistente na terra.

  
ATLAS, PROMETEU E O ABUTRE (TAÇA ESPARTANA, 550AC)


  Resolveu Hércules a seguir tomar a direção da Líbia, passando antes pelas montanhas do Cáucaso, onde foi atraído por uns gritos.Aproximando-se, reconheceu o titã Prometeu. O filho de Jápeto ali estava agrilhoado nas rochas, à mercê das visitas diurnas de um abutre gigantesco, filho de Tifão e de Équidna, que, com suas bicadas, lhe destruía o fígado, recomposto durante a noite, quando a monstruosa ave se ausentava. Libertado por Hércules, agradecido, Prometeu,  orientou o nosso herói a não só tomar o caminho correto para chegar aos Jardins como o aconselhou a fazer com que alguém colhesse os pomos de ouro por ele; que não os colhesse diretamente, que o fizesse por intermédio do próprio titã Atlas que os guardava. Hércules indagou sobre a razão deste conselho; Prometeu lhe respondeu enigmaticamente: disse-lhe apenas que não o sentia preparado para colher os pomos.

Chegando finalmente ao Jardim das Hespérides, Hércules liquidou logo o famoso dragão de cem cabeças que guardava os pomos e contou ao titã o motivo de sua viagem, pedindo-lhe que os colhesse no seu lugar. Surpreso com a acolhida até entusiasmada de sua proposta, recebeu apenas um pedido do titã: que Hércules, por um momento, sustentasse a abóbada celeste sobre os seus ombros enquanto ele iria colher os pomos. Ao voltar, Atlas se recusou a receber de volta a abóbada, declarando que a tarefa doravante caberia a Hércules, prontificando-se ele a pessoalmente levar os pomos a Euristeu. Depois de alguma discussão, Hércules simulou que concordava com a proposta de Atlas. Pediu-lhe, porém, por um momento, apenas por um momento, que recebesse de volta a abóbada enquanto, para melhor acomodá-la, ajeitaria um suporte aos seus ombros. Atlas de nada desconfiou. Depositou os pomos no chão e recebeu de volta a abóbada. Imediatamente, Hércules recolheu os pomos, liquidou as ninfas e, como era de seu costume, devastou completamente o Jardim. A seguir, afastou-se, deixando Atlas, atônito, com a abóbada sobre os ombros. Voltando à Grécia, Hércules entregou os pomos a Euristeu, que, não sabendo o que fazer com eles, solicitou a Palas Athena que os depositasse novamente nos Jardins. Esta, dentre muitas, parece ser a versão final do terceiro trabalho mais atestada.

O que chama mais a nossa atenção na jornada do herói neste trabalho é a multiplicidade de seus acontecimentos, o grande número de detalhes, o caráter dispersivo de sua trajetória, os muitos caminhos tomados, a necessidade, a cada passo, de informações que orientem o passo seguinte e as soluções que Hércules foi encontrando para superar os seus obstáculos, vencer à força ou com esperteza bandidos, monstros ou poderosos que simplesmente a ele
ROAD MOVIE
se opusessem por razões diversas. De todos os trabalhos do ciclo, nenhum como este quanto ao grande número de acontecimentos. Se válida a aproximação, este trabalho tem todos os ingredientes daquilo que chamamos hoje de um road movie, com destaque que faço para o que no gênero há de fundamental, isto é, não há metas a atingir, mas tão somente caminhos a trilhar, nos quais são possíveis, quando muito, apenas vitórias provisórias.

Por falta de informações, Hércules teve que se lançar no mundo, sem suporte algum. Perder-se nas quatro direções que constituem o total do espaço no qual, ao agir, ele (o homem, nós) tem (temos) que definir o seu (nosso) destino. A lição maior a apontar, quando associamos este trabalho ao signo de Gêmeos, é a de que o homem para viver no mundo está inapelavelmente preso à sua consciência, pois é por ela que o mundo se desvela para ele. É em meio à multiplicidade dos acontecimentos que o cercam que o homem tem que fazer as suas escolhas, sem perder vista, se possível, os outros seres que estão à sua volta, algo que Hércules só começará a entender, ainda que confusamente, no seu décimo primeiro trabalho (A limpeza dos estábulos de Augias).

Hércules, nesta terceira etapa de sua caminhada, mergulha de cabeça na multiplicidade, no mundo dos acontecimentos. Para nós, isso quer dizer viver no relativo, na ambiguidade, ainda que possamos voltar os nossos olhos para uma ideia de absoluto quando pensamos nos outros homens, isto é, naquilo que podemos ter em comum, a menor ou maior partícula da energia cósmica presente em cada ser.

Somos nós que impomos um sentido ao mundo. O Hermetismo greco-alexandrino já nos falou disto quando afirmou que o universo é mental, ou seja, o universo é limitado à consciência humana (mesmo que falemos de Deus, só temos a nossa consciência para falar dele). Isto quer dizer que é o homem, em meio à sua angústia, às suas dúvidas, aos seus obstáculos internos e externos, quase sempre contraditório e perplexo, que tem a obrigação dar um sentido às coisas, retirando-as da indeterminação, do caos, se quisermos, e escolher os seus próprios caminhos. O homem vive no mundo das polaridades e através delas é lançado na multiplicidade que lhe oferece continuamente uma enorme possibilidade de sentidos, de interpretações. Diante desse ininterrupto fluir e da sua infinita complexidade, como proceder?

Há neste terceiro trabalho de Hércules várias referências a estas ideias de dualidade, de multiplicidade, de pluralidade, palavras como jardim, três e pomos, por exemplo, só para ficarmos com o
JARDINS FLORESCENTES
seu título. Tudo isto é sugerido pelo próprio cenário do ato final do trabalho. Os jardins, lembremos, nos mitos, nas lendas e nas narrativas, são símbolos de uma fecundidade sempre renascente, de um lugar onde as formas não param de se desenvolver ao ritmo das estações. Nesse sentido, representam a vida e a sua riqueza. Um mundo sempre em movimento, mudando constantemente, suas cores, a variedade dos seus perfumes, tudo tornado caleidoscopicamente visível.

 São estas observações e outras que a seguir se farão que nos permitem relacionar este trabalho com o terceiro signo zodiacal de Gêmeos, do elemento ar, signo que faz a ligação entre o fim da primavera e o início do verão. As lições deste trabalho começam assim pelo entendimento do que representa o número três; com ele, realmente, terminada a manifestação, começa a multiplicidade. O número três traduz não só o jogo do pensamento como o movimento físico e a vida biológica do ser humano, que se resolvem pelo aparecimento, pela permanência e pelo desaparecimento das coisas, as três dinâmicas universais, tudo continuamente renovado.

A primavera tem início em Áries, quando o ímpeto vital que se renova anualmente aparece; este ímpeto se materializa em Touro,
signo das formas que buscam através das ramificações e da folhagem (Gêmeos) recolher do meio ambiente os elementos para a sua sobrevivência. Gêmeos, é o signo que governa todas as relações do ser com o meio imediato, falando-nos de trocas, de contactos que tanto excitam como oprimem simultaneamente. É Gêmeos, no corpo humano, o signo dos processos respiratórios, dos dois lóbulos pulmonares (fig. esquerda), e das trocas mentais (dois hemisférios cerebrais - fig. direita).

A essência bipolar do signo é representada pelos gêmeos, figuras que lembram que em nossa vida interior há sempre essa tensão entre dois lados, um ser e um não-ser, pois somos e não somos simultaneamente. Um lado do signo, Castor, é terrestre, o outro, Polideuces, é celeste, espiritual. O primeiro é nervoso, apresenta uma grande inconstância de sentimentos, sensibilidade instável, muita movimentação física e mental, um tipo que tende a se ligar e desligar constantemente. Os estímulos exteriores, sempre renovados, por isso não deixam marcas. Daí as contradições, os impulsos sucessivos, a presença imperiosa do presente, a espontaneidade, a falta de coerência, a atualidade, a vontade enfraquecida, a conduta irregular.

O signo de Gêmeos é como tal a imagem de todas as oposições interiores e exteriores, contrárias ou complementares, relativas ou absolutas, que se resolvem dentro do homem numa tensão criadora. Simboliza os contactos humanos, a comunicação, a emissão e a recepção de mensagens, a movimentação, as contingências do meio no qual vivemos e sobretudo a dispersão sob todas as suas formas. 

DIÓSCUROS
  Em todas as culturas, encontramos histórias referentes aos gêmeos. São representantes do signo os Dióscuros, Castor e Polideuces (Polux para os romanos). Filhos de Zeus e Leda, são irmãos de Helena e de Clitemnestra, a primeira mulher de Menelau, rei de Esparta, e a segunda mulher de Agamemnon, rei de Micenas, ambos irmãos. Um dos gêmeos, Castor, morre numa luta. Zeus resolve então conceder a cada um deles a imortalidade alternadamente, para que um deles esteja sempre no Olimpo.

Nas histórias contadas sobre gêmeos, uns, às vezes, são absolutamente simétricos, noutras vezes um é luminoso e o outro é obscuro. Ou seja, um é celeste e outro é terrestre, um é introvertido, outro é extrovertido e assim por diante. Exprimem eles sempre o dualismo das tendências espirituais e materiais, diurnas e noturnas, do ser humano. Lembram sempre as diversas oposições internas que nele aparecem e a necessidade do sacrifício de uma parte alternadamente. Multiplicidade e unidade, dualidade superada ou dispersão.

Já o tipo Polideuces será mais assentado, mais tranquilo, notando-se nele uma predominância da vida intelectual, às vezes “um espírito sem alma”, alguém que se exterioriza, mas que pode, em alguns casos, nunca se comprometer. Observa sem participar, discorre, teoriza, muito informado sempre. Para não cair nas armadilhas afetivas, brinca, ou então recorre à sua destreza manual, uma espécie de prestidigitação. Inclinando-se bastante na direção da vida mental, exibindo traços marcantes de sarcasmo, de cinismo, quase sempre presentes para esconder a angústia, o tipo Polideuces tem sempre necessidade de ampliar seus interesses. Costuma ser muito curioso, podendo se dar bem na exploração de muitos gêneros literários, mas sempre presente a ameaça da superficialidade e da variedade dos temas. Polideuces é sempre mais “noturno”; no mito, era muito reverenciado pelos ladrões, pois nunca deixava pistas, nem era apanhado em contradições. Já o tipo Castor é mais “diurno”, mais ligado a inúmeros afazeres materiais, mais dispersivo.

HERMES E O CADUCEU
                 Implícita em ambos, porém, está aquela que talvez seja a
característica mais acentuada da personalidade geminiana, a aspiração de seguir dois caminhos contrários ao mesmo tempo, as duas possibilidades da oposição contraditória, ausente a força necessária para sintetizá-las numa forma superior. Esta certamente a lição que Hércules deveria retirar do trabalho, aprender com seu bisavô no mito, Hermes (Mercúrio, planeta regente do signo na astrologia), guia dos seres nas mudanças de estado, que as forças contrárias em ação no universo devem ser equilibradas dinamicamente.

Esta lição está sintetizada no caduceu de Hermes, no qual as serpentes simétricas, numa espiral dupla, evocam o desenvolvimento progressivo, a repetição infinita dos ciclos da vida. É através dessa imagem que é possível compreender que, no nível humano, o caduceu representa o equilíbrio psicossomático (psycho = psiquismo + soma = corpo), o das forças vitais e psíquicas e sua evolução em direção de um equilíbrio, constantemente perdido e constantemente realizado. As duas pequenas asas que fazem parte do caduceu simbolizam a libertação do homem das forças instintivas e sua identificação com os níveis superiores da existência, com as próprias forças em operação no cosmos.

 Os geminianos, de um modo geral, lidam sempre com teses e antíteses, sendo-lhes difícil, senão impossível, a síntese. Assim, as buscas e as tentativas acabam se tornando mais importantes que as realizações. A justificativa para essa atitude está, nos tipos superiores do signo, em que a verdade de um homem não está na sua posse, mas, sim, no esforço sempre renovado de buscá-la. As
HAMLET NO CINEMA
forças do ser humano não se ampliam pela posse, mas pela investigação, fator que realmente faz a diferença. A posse leva à quietude, à inércia e invariavelmente ao orgulho. A consequência de tudo isso é a inquietação interior, a tensão permanente, a dúvida, o complexo de Hamlet, a pressão mental que obriga a pensar em termos contraditórios, uma tendência que leva sempre ao oposto do que está sendo pensado.

Uma peculiaridade interessante deste trabalho é que Hércules, além de bandidos e monstros, tinha um inimigo muito perigoso a enfrentar, as ninfas Hespérides. Bandidos e monstros, todos sabem, são os inimigos naturais dos heróis.  Os dragões são seres fantásticos que, dentre outras funções nas histórias, exercem a de guardiães, de protetores de tesouros. Como tal, são os adversários que o herói tem de vencer para ter acesso a tesouros que eles guardam. Esses tesouros estão sempre conservados em lugares de difícil acesso, no alto de montanhas, em grutas labirínticas, em abismos inacessíveis, na profundeza dos mares, em lugares distantes.

Os que procuram estudar os mitos de um modo mais consciente sabem que os tesouros, na realidade, estão escondidos dentro do ser humano. Ouro, pedras preciosas, princesas, ervas maravilhosas que curam, talismãs que permitem acesso a um outro tipo de vida, amuletos que protegem contra tudo, são exemplos metafóricos desses tesouros. Eles não são dons gratuitos, dádivas que miraculosamente nos são oferecidas. Ao contrário, a conquista dos tesouros é algo que exige do herói longas provas, obstinação, firmeza, preparação, domínio da ação.

Os tesouros escondidos a conquistar têm, no fundo, uma natureza moral ou espiritual e as provas, os combates, contra os monstros ou os bandidos das estradas que tentam impedir a caminhada do herói para conquistá-los, são obstáculos que estão dentro de nós mesmos. No mito, tanto o tesouro como o monstro são aspectos de nossa vida interior; para libertar aquele será preciso vencer este, geralmente fixado na imagem clássica de um ego hipertrofiado, para se ter acesso a níveis superiores de existência.

Geralmente representados por figuras dracônticas, os monstros podem contudo se apresentar sob outros aspectos muito diferentes, muito sedutores, extremamente agradáveis, mostrando-se tão ou mais perigosos que aqueles, como é o caso deste trabalho. Referimo-nos às muitas figuras femininas do mito como as sereias e as ninfas, que, com maior ou menor sucesso, sempre tentaram desviar o herói de seu caminho. 

NINFAS
A mitologia grega considera as ninfas como expressões de Geia, alquimicamente da terra e da água, elementos passivos, símbolos do feminino. Sob esse nome genérico, (etimologicamente, ninfa quer dizer coberta com véu), os gregos agrupavam todas as divindades (secundárias) femininas da natureza, que povoavam os mares, as águas, os bosques, as florestas, os rios e riachos, os oceanos, as montanhas, os vales férteis, os lagos e as árvores. Figuras de rara beleza, eram representadas nuas ou seminuas. A elas eram atribuídos poderes fertilizantes e nutrientes quando se misturavam com os vários aspectos do mundo natural.  

Ternas, solícitas e protetoras, sua ação benéfica se estendia não só aos deuses, mas também a muitos mortais. De sua união com estes nasceram muitos heróis, ancestrais das primeiras raças humanas. Alegres, despreocupadas, sempre entoando cantos, fascinantes em qualquer situação, eram grandes tecelãs, despertando nos humanos sempre um misto de admiração e de temor. Tinham fama de profetisas, de raptoras de crianças e de jovens, além de perturbadoras do espírito dos homens. O mortal que as visse poderia ficar tomado por uma espécie de loucura, uma excitação nervosa que provocava a despersonalização e a abolição da vontade, à qual se dava o nome de estado ninfoléptico. O belíssimo Hilas, companheiro de Hércules, na expedição dos Argonautas, por exemplo, foi raptado pelas ninfas náiades, que, extasiadas pela sua beleza, o levaram para a profundeza das águas a fim de imortalizá-lo. Esta a provável razão pela qual Prometeu recomendou a Hércules que não fosse colher diretamente delas os pomos por elas guardados.

Provocador de conflitos (pomo da discórdia), causador da expulsão do paraíso, o pomo (a maçã) é em muitas histórias um símbolo ligado à multiplicidade dos desejos terrestres (daí o apelido de New
THE BIG APPLE
York, The Big Apple, a cidade que pode satisfazer todos os desejos do mundo). É, como tal, de Afrodite na mitologia e do planeta Vênus na astrologia. O lado machista da mitologia grega, transferido depois para as três grandes religiões patriarcais (Judaísmo e suas dissidências, o Cristianismo e o Islamismo), está mais do que evidente aqui. Ao suceder ao matriarcado (religiões da Grande-Mãe), o patriarcado procurou por todos os meios destruí-lo, embora dando nos panteões que montou um lugar menor, subserviente, às divindades femininas. Ressalte-se que própria psicologia, como a temos no ocidente, nas suas várias expressões, fez do princípio feminino (anima) sempre uma ameaça, um perigo mesmo, para o princípio masculino, identificado por ela, como para as religiões patriarcais, com o princípio espiritual.

A grande lição do terceiro trabalho de Hércules está na necessidade da percepção de que por trás da multiplicidade se esconde a unidade. Ou seja, a necessidade de integrar, de buscar um centro, de se sair dos aspectos fenomênicos, periféricos, da existência. Num
ARLEQUIM
plano mais simples, transformar a informação em conhecimento, não para gratificar o ego, mas distribuí-lo para tornar o mundo melhor (função espiritual). Abandonar o ecletismo estéril, o diletantismo superficial, rejeitar a imagem do decifrador de todos os enigmas, mas que não resolve o da sua própria vida, fazer, em suma, com que o filósofo, o intelectual, o terapeuta, o doutor dispam a sua fantasia de Arlequim (um dos grandes símbolos do signo de gêmeos). Unir, integrar, sintetizar, transformando a síntese, diante das respostas do mundo, em nova tese e assim por diante.

A polaridade geminiana é invariavelmente considerada só sob o ponto de vista masculino. Deve-se isto provavelmente ao fato do signo ser masculino, ativo, aéreo, ligado aos arquétipos do
pensador e do puer aeternus, associado a ideias de “eterna juventude”. O feminino de puer (menino, jovem) é puella (menina adolescente, moçoila). A manifestação deste complexo (masculino ou feminino) é muito comum em alguns signos astrológicos, sendo inegavelmente muito mais forte a sua presença nos tipos geminianos. Há muitos casos no mundo feminino de geminianas atacadas por este complexo (puella aeterna), casos esquecidos, que a Astrologia não esquece. Como exemplo, cito o de Marilyn Monroe, que não suportou o envelhecimento. Lembro que o chamado complexo de Peter Pan é de natureza tipicamente geminiana; nos tipos mais malogrados, ele aparece como uma recusa à assunção de responsabilidades materiais e afetivas (permanência numa eterna juventude livre e descomprometida). 

CONSTELAÇÃO DE GÊMEOS
A constelação de Gemini vai hoje de 1º a 23ª Câncer. Segundo Ptolomeu, as estrelas que estão nos pés da figura têm características mercurianas e venusianas (moderadamente). As brilhantes estrelas na coxa são saturninas. A estrela alfa de Gemini é Castor, a 19º 33´ Câncer. Ovídio chamava esta estrela de Eques, isto é, o mortal gêmeo cavaleiro, filho de Tíndaro. É oportuno lembrar que até o início da era cristã, do período helenístico para o período romano da história grega, esta estrela recebia o nome de Apolo, uma divindade diurna. No Egito, lembro, Castor, como estrela da manhã, era chamada de Horus, sendo Seth o seu nome vespertino, noturno (Polideuces). Na Índia, os nomes eram Buddha e Rauhinya. Os babilônicos usavam Castor para marcar a sua décima primeira constelação eclíptica. Polideuces (Pólux), estrela beta, está a 4º 05´ de Castor, isto é, na longitude 23º 38´ Câncer.  É chamada por Ovídio de Pugil, isto é, O Pugilista, o gêmeo imortal, filho de Zeus. Ptolomeu afirmou que a estrela chamada Apolo (Castor) era como Mercúrio, enquanto Polideuces, por ele chamada de Hércules, era semelhante ao planeta Marte.

O que devemos reter hoje sobre estas duas estrelas é que elas são produtoras de alternância, de polaridades, sendo encontradas bastante ativas no mapa de muitos escritores, compositores, artistas (James Joyce, John Lennon, Lewis Carroll, Charles Dickens, Dante
Alighieri, Paul Valéry, Robert Schumann, Alfred de Musset e outros) que “misturam” o bem e o mal em sua vida e nos seus textos tendo em vista uma proposta de integração, de busca de uma totalidade, sempre difícil, para não dizer impossível. Se Castor prepondera, o lado luminoso costuma ser mais enfatizado, trazendo mais agitação (Jean Cocteau). Se Polideuces se impõe, há consciência do conflito entre os dois, há mais angústia, questões filosóficas. Um geminiano deste último tipo é, por exemplo, Jean-Paul Sartre.

Alhena, a 8º 24´Câncer, é a estrela gama de Gêmeos. Está situada no pé do irmão que está ao sul. O nome vem do árabe “Al Hanah”, palavra que sugere uma idéia de ferimento, sendo conhecida pela expressão “O tendão de Aquiles”. Sua natureza para Ptolomeu é mercuriana e venusiana (moderada). Os árabes a designavam por uma palavra que significava “marca”, “cicatriz“ (ferro quente). Esta estrela, entre os egípcios, representava uma marca divina deixada na terra, algo como a pegada de um deus. Um toque sagrado, pois, que pode significar orgulho, excesso de determinação. Entre os judeus, era a marca divina imposta a Caim, marca que o livrou de ataques e agressões, mas, por outro lado, símbolo da sua eterna peregrinação até o final dos tempos. Alhena pressupõe a ligação a uma causa, a um destino, a ideia de algo a ser seguido apesar de todas as adversidades (um ferimento, por exemplo). As metas podem ter uma tradução física (nomadismo, significado acidental pelo signo oposto, Sagitário) ou intelectual, segundo as relações da estrela com os planetas do mapa. Wasat (O Meio, em árabe) é a estrela delta, hoje a 17º 48´Câncer, de natureza saturnina. Pode expor a violências e a perigos (produtos químicos, gases e venenos). As demais estrelas de Gêmeos não têm importância astrológica.

CONSTELAÇÕES DE ORION E DA LEBRE
Relacionada às vezes com a constelação de Gêmeos, a constelação da Lebre (5ºGêmeos-3º Câncer), situada perto da de Orion e do Cão Maior, tem como principal estrela Arneb, mas sem importância astrológica. A única tradição na qual ela aparece com destaque é a egípcia, na qual se fala de um coelho divino que tinha por função a guarda de um ovo sagrado. Por sua incrível fecundidade, a lebre é símbolo do deus Osíris, tanto ligado aos ciclos do mundo vegetal como, no âmbito religioso, à luz moral revelada aos neófitos (ervas novas) e à revelação do divino. Em qualquer circunstância, a lebre lembra o grande número, algo que não pára de se manifestar, indo de um lugar para outro, algo muito vivo e inquieto, mas evocando sempre, no geral, a grande quantidade em detrimento da qualidade.