segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

SEGUNDO TRABALHO DE HÉRCULES

            


O Touro enlouquecido de Creta -  Homero, na Odisseia, nos fala de Creta, uma ilha fértil e formosa que ficava no meio do mar azul escuro, densamente povoada. Uma de suas grandes cidades era
PALÁCIO DE CNOSSOS
Cnossos, de onde o rei Minos a governava, desfrutando da amizade de Zeus todo-poderoso. Historicamente, sabe-se que a ilha era habitada desde o período Neolítico. Por volta de 3.000 aC, foi invadida por um povo oriundo da Anatólia que trouxe as técnicas dos trabalhos em bronze  e uma arquitetura bastante evoluída. A esse período histórico e aos seguintes se dá o nome de Minoico ou do Bronze, assim dividido: a) minoico histórico (2.800-2.100 aC); b) minoico médio (2.100-1.580 aC); c) minoico recente (1.580-1.100 aC).



Conforme pesquisas arqueológicas realizadas por A.J. Evans no início do século XX, o suporte histórico das narrações míticas foi confirmado, encontrando-se referências a personagens como Minos, Dédalo, Ícaro, Hércules, Minotauro, Ariadne, Teseu e outros. Os primeiros palácios da ilha, construídos em Cnossos, sua capital, e em Phaistos, Mallia, Tylissos e Kato Zakros, foram destruídos no séc.XVIII aC por invasores vindos do continente. Reconstruídos depois, foram definitivamente arrasados por volta do séc. XV aC pelos aqueus, que passaram a dominar a ilha, instaurando-se, então, a chamada civilização creto-micênica. A decadência de sua esplendorosa civilização se precipitou por volta de 1.400 aC quando um terremoto devastador se abateu sobre o noroeste da ilha, destruindo os palácios que haviam sido reconstruídos. Com a chegada das tribos dóricas, mais tarde, por volta de 1.100 aC, a civilização creto-micênica desapareceu, ficando desde então Creta submetida à Grécia continental, como um território ultramarino.

Creta foi durante séculos uma talassocracia, um grande império marítimo e comercial que dominou o Mediterrâneo oriental.  Com uma civilização rica, requintada, com grandes palácios, um intenso
movimento artístico e uma vida social muito animada por festas, touradas, banhos, termas, jogos públicos, praças de esportes, e com fábricas de jóias, perfumes e cerâmica, Creta impunha-se comercialmente às ilhas Cíclades, à Grécia aqueia, ao Egeu, à Síria e a Chipre.

              Sob o ponto de vista religioso, cultuava-se na ilha uma
A GRANDE MÃE
divindade feminina, uma espécie de Grande Mãe, que representava a fecundidade. Este modelo, que incorporava no seu simbolismo traços que lembravam as águas do mar e o elemento terrestre, tem certamente origem no período Neolítico, quando a mulher, devido à valorização da agricultura, adquiriu grande prestígio social. A fertilidade da terra e das águas ligava-se solidariamente no modelo, tornando-se a mulher, porque é dela que vem a vida, símbolo da abundância. Embora governada por um imperador, Creta era o que chamamos de ginecocracia, desempenhando as sacerdotisas, nos cultos, um papel muito relevante. Não havia templos, celebrando-se os rituais em plena natureza, em lugares elevados, montanhosos, e em cavernas.

A capital da ilha era Cnossos, construída em meio a olivais e ciprestes, tomando o nome de Labirinto o palácio real. A cidade ficava a 5 km. do litoral. A atual capital, Heraklion, foi fundada pelos árabes no séc.IX dC; foram eles que deram o nome de Cândia tanto à ilha quanto à sua capital. O palácio real era uma extensa construção, com muitos corredores, salas e subterrâneos. O rei Minos, que descendia de Zeus, governava a ilha. 




Miticamente, tudo começou quando Zeus pôs os olhos na linda Europa, filha do rei Agenor, a colher flores numa praia em Sidon, reino do pai, na costa fenícia. Tomou então a forma de um touro maravilhoso, aproximou-se da jovem que, seduzida pela beleza do animal, nele montou. O touro divino entrou no mar e levou a princesa para Creta. Chegando à ilha, num local futuramente chamado pelo nome de Górtina, perto do monte Ida, Zeus, na sua forma divina, possuiu Europa num bosque de plátanos. Dessa relação, nasceram três filhos, Minos, Radamanto e Sarpedon. Era rei da ilha o mortal Asterion, com o qual Europa, por arranjos de Zeus, se casou depois, levando os seus três filhos, adotados por ele.

O plátano, como o carvalho, o cipreste, a oliveira e o pinheiro, era uma árvore sagrada, objeto de um culto do qual fazia parte o rito das dendroforias (procissão em que os troncos dessas árvores eram exibidos). Por terem presenciado o conúbio amoroso entre Zeus e Europa, os plátanos de Górtina receberam o privilégio de se manterem eternamente verdes. 

Para celebrar a sua união com a princesa Europa e o nascimento da nação cretense, Zeus colocou nos céus a forma taurina que tomara, como a constelação de Touro, a segunda na ordem zodiacal. Dessa constelação passaram a fazer parte a estrela de Aldebarã (alfa), considerada uma das quatro estrelas reais pelos persas (as demais são Antares, Fomalhaut e Regulus) e dois asterismos, as Plêiades e as Híades, muito importantes. 

Morrendo Asterion, Minos assumiu o poder. Casou-se com Pasífae, filha do deus Hélio e de Perseida, irmã de Perses, Eetes, rei da Cólquida, e de Circe, a maga. Minos e Pasífae tiveram muitos filhos. Minos logo começou a se envolver em muitas aventuras amorosas e a ele se atribui, no mito, a "invenção" da pederastia, motivada por sua paixão por Mileto, um filho do deus Apolo. Quanto a Pasífae, eram famosos os ciúmes que demonstrava diante das aventuras do marido. Por pertencer a uma família de feiticeiras (irmã de Circe e tia de Medeia, filha de Eetes), Pasífae lançou uma maldição contra o marido: todos os relacionamentos que o rei tivesse fora do casamento causariam a destruição das mulheres que com ele se relacionassem, pois do seu corpo sairiam serpentes e escorpiões que matariam as suas parceiras amorosas.
 
Minos, a cada nove anos, se dirigia a uma caverna do monte Ida a fim de fazer consultas e obter orientação de Zeus, seu pai divino. Por isso, seu governo, assim inspirado, era considerado excelente por todos, suas leis justas e magnânimas. Isto não impediu, entretanto, que seus irmãos viessem a disputar o trono com ele. Minos pediu, então, um sinal aos deuses para que se confirmasse o direito que tinha de ocupar sozinho o trono. Poseidon fez com que um touro branco de grande beleza saísse das águas, atendendo assim o que Minos pedira. Uma condição: o touro deveria logo ser sacrificado aos deuses. Minos, entretanto, que possuía um enorme rebanho e diante da beleza do animal, pensando na riqueza que poderia obter se o usasse como reprodutor, não o sacrificou. No lugar do touro divino, levou ao sacrifício um animal inferior, velho e doente.

PASÍFAE, DÉDALO E O SIMULACRO
 A punição divina não tardou. Os deuses fizeram com que Pasífae passasse a nutrir pelo animal divino uma alucinada paixão. A rainha, tomada por um furor erótico incontrolável, pediu a Dédalo, inventor e artista grego que vivia exilado na ilha, que resolvesse o seu problema. Dédalo fabricou um simulacro de um animal, fêmea, para que a rainha nele entrando pudesse se relacionar sexualmente com o touro divino. Dessa relação nascerá o famigerado Minotauro e, como se isso não bastasse, os deuses enlouqueceram o touro divino, pai do monstro, metade homem, metade touro. 




O touro divino, enlouquecido, que ninguém conseguia capturar, começou a atacar pessoas, matando muitas, e a destruir plantações e propriedades. Quanto ao Minotauro, depois de ingentes esforços, Minos conseguiu escondê-lo nos subterrâneos do enorme palácio, que, como sabemos, recebeu o nome de Labirinto, um emaranhado de corredores e de salas, em diversos níveis; quem nele penetrasse jamais encontraria o caminho de volta para a luz. Este palácio, segundo algumas tradições, Minos o mandara construir para que o monstro não fosse visto por ninguém, tamanho o seu horror e vergonha com relação ao que ele e Pasífae haviam gerado.

Com cabeça de touro e corpo humano, o Minotauro se alimentava de carne humana. Eram os gregos atenienses que forneciam o seu alimento. A cada ano, conforme um pesadíssimo tributo que Minos impusera à polis grega, deveria ser enviado a Creta um determinado número de jovens para que o Minotauro os devorasse. O pretexto para a imposição deste tributo fora a morte de Androgeu, príncipe cretense, assassinado numa emboscada, quando participava de jogos esportivos em Atenas. 

HÉRCULES CONDUZINDO O TOURO
  
Teseu, o grande herói ateniense, como sabemos, encarregar-se-á
mais tarde de matar o Minotauro. A captura do touro enlouquecido

de Creta ficou por conta de Hércules como o seu  segundo trabalho. Conforme determinação de Euristeu, o animal deveria ser capturado e entregue aos Cíclopes. Hércules localizou o touro nas escuras florestas da ilha, primeiro pelo seu mugido e depois pelo reconhecimento de um sinal que o animal possuía na cabeça, entre os chifres, uma estrela. A luta foi tremenda, mas o nosso herói conseguiu subjugá-lo, levando-o para o continente, onde o entregou aos gigantescos Cíclopes.

CÍCLOPES
 O incontido desejo de lucro por parte de Minos e os arrebatamentos sensuais de Pasífae, que estão na origem de sua sexualidade degenerada, uma verdadeira zoofilia erótica, acabaram por gerar um monstro que precisava ser escondido Não podia ele ficar exposto à luz do dia, isto é, ser admitido pela consciência. Foi levado para a escuridão do labirinto, obra de Dédalo, o artista corrupto. É neste sentido que o labirinto e o Minotauro se tornam, respectivamente, símbolos do subconsciente e do recalque, este último um mecanismo de defesa que teoricamente tem por função fazer com que atitudes e condutas julgadas incompatíveis com a personalidade oferecida ao mundo, mas de impossível controle, passem do campo da consciência para o subconsciente.


   
É desse contexto que sai a palavra labirinto (etimologicamente, de labrys,  duplo  machado  ou  bipene,  símbolo  de  Creta)  para
alegorizar, sob o ponto de vista religioso, o mundo como labirinto, a queda e a perdição do espírito no plano da matéria, a dispersão do homem na perplexidade do mundo fenomênico. Os artistas medievais, inspirados pelos alquimistas, esculpiram no chão de muitas catedrais, como na de Chartres, por exemplo, labirintos, para representar essa dispersão. Esses labirintos eram também chamados de “caminhos de Jerusalém” e, como tal, considerados substitutos da verdadeira peregrinação.
 
LABIRINTO DA CATEDRAL DE CHARTRES
O touro é o símbolo da segunda constelação zodiacal, associada ao elemento terra, sendo, como signo astrológico, considerado fixo (2°mês da primavera). Áries, relacionado com o trabalho anterior, como se viu, tem relação com o elemento fogo, sendo considerado, por ser o início de uma estação (equinócio de Primavera), um signo cardinal. O elemento terra, no seu aspecto fixo, diz respeito basicamente ao que é tangível, sólido, palpável, concreto. Como tal, temos aqui ideias de quantificação, limite, valor, densidade, permanência, cálculo, remuneração, soma, aplicação, lucro material, acumulação, segurança, firmeza, investimento, riqueza, talento construtivo. Nas expressões inferiores, Touro se relacionará com avareza, conservadorismo, obstinação, possessividade, sovinice, egoísmo, inércia.

O taurino como tipo astrológico, na ânsia de obter segurança, de possuir e acumular, pode exagerar, como Minos o fez, não dando aos deuses um testemunho de sua obediência, isto é, deixar-se dominar pelo seu "touro interior’, pela sua avidez. O touro é símbolo do desejo material, carnal, nas suas mais diversas formas. Por isso, sempre presentes quando a ele nos referimos nesse aspecto ideias de esforços significativos no sentido  de se abordar o mundo com os pés no chão, a segurança na frente de qualquer coisa. O fruto desse desejo pode se tornar um monstro que se alimenta de "carne humana". Geramos monstruosidades com os nossos desejos materiais se não os soubermos orientar corretamente. Essas monstruosidades, geralmente, nós as escondemos dos outros. O labirinto é um dos símbolos desse enredamento, um afastamento cada vez maior da luz.

Hércules terá neste trabalho que aprender a separar a matéria do espírito, diferenciar, discernir. A vitória sobre o touro é a vitória sobre a materialidade, a ganância, o desejo de lucro de qualquer maneira, uma vitória da inteligência sobre o instinto. Na Índia, é o
SHIVA E NANDI
domínio da energia (Áries) que se materializa (Touro), como Shiva o representa quando vem montado sobre o touro Nandi, sua montaria. Outra lição deste trabalho é que o touro como símbolo do suporte material do universo não pode ser suprimido, destruído. Ou seja, temos que evitar a supressão do físico em nós, sempre perigosa, como propõem muitas seitas religiosas, diante dos inúmeros e enormes problemas fisiológicos e psicológicos que esta proposta acarreta.

Os excessos de limpeza corporal, de castidade, de pureza etc. geram mentes doentes. Tradicionalmente, um exemplo do que estamos aqui a abordar é a Suíça; acima, na superfície, ela é "branca", "séria" ,  "honesta" ,  "religiosa" ,  "imaculada ",  temente  de Deus, certamente.

Abaixo, nos cofres de seus bancos, é a imagem do labirinto cretense, ou seja, é ali que grande parte do dinheiro do mundo obtido criminosamente é guardado. Mais: determina-se neste trabalho que Hércules domine o animal e o conduza para a terra firme (o continente). No mito, como se sabe, as ilhas são de Poseidon, lugares paradisíacos, ilusórios, onde o material predomina sobre o espiritual. Não é por acaso que muitos “paraísos fiscais” no mundo moderno se situam em ilhas. Trazer o touro para o continente e entregá-lo aos Cíclopes (gênios construtores), é colocar a riqueza material acumulada para circular a fim de que se produzam bens e serviços que favoreçam a humanidade como um todo, inclusive culturalmente, espiritualmente. A vida material que perde essa perspectiva transforma-se em vida infernal, o estado do psiquismo de quem sucumbe ao monstro. Os "sacrifícios" que a ele fazemos (os jovens devorados) não são mais que os subterfúgios e as ilusões que criamos para nós mesmos para mantê-lo quieto.  

Já a paixão de Pasífae está relacionada com a luxúria, a sensualidade, a exacerbação do prazer dos sentidos na sua forma máxima, a sexualidade, e, atualmente, com todas as formas de consumismo. Dédalo, por seu lado, é o símbolo do artista corrupto, a serviço dos poderosos, é a perversão do poder criador. Tudo isto caminha junto com a decadência dos costumes, com a prostituição da arte diante da riqueza. Todo este apego e poder material que Creta representa nos apontam para um mundo que substituiu a vida superior pelo gozo material (Minos-Pasífae) e pela ciência com seu subproduto, a tecnologia (Dédalo, o inventor e artista). As touradas, como as tínhamos em Creta e as temos até hoje, são uma expressão do que aqui se coloca: ao invés de questionarmos a nossa besta interior, nós a matamos exteriormente. Sacrificamos um animal através de um mediador (toureiro), no qual nos projetamos, e com isto nos sentimos dispensados de fazer qualquer sacrifício interior.

Nos taurinos, de um modo geral, encontramos uma grande propensão para o trabalho, para a produção de bens materiais. Por isso, são grandes neles o apelo da sensualidade e o instinto de
EROS E VÊNUS  (LORENZO LOTTO)
conservação. O signo é governado pelo planeta Vênus, como criador de formas. Touro simboliza na natureza a condensação da energia representada por Áries, o signo anterior. No geral, em Touro predomina a paz, o prazer dos sentidos, os valores de uma Vênus carnal, vibrante de emanações terrestres. Muito ligado ao verde, sua cor, o taurino, no geral, gosta da natureza, dos campos, dos pomares, dos parques, das praias, que servem para abastecer a sua sensorialidade.

Se Áries é signo dominado por astros masculinos (Marte e Sol), em Touro predominam astros femininos, Vênus e Lua. Daí a grande
tendência do taurino de buscar, nas suas expressões mais concretas, a horizontalidade, a largura, a ocupação do espaço (muitos taurinos têm “horror” ao vazio). Os móveis taurinos têm sempre uma boa base ou pés fortes que os sustentem. O simbolismo da mesa, como fica fácil entender, faz parte do mundo taurino, pois nela comemos, nela trabalhamos, nela calculamos, nela expomos coisas. É desse cenário tudo o que serve para guardar: arcas, baús, armários, guarda-comida, cofres, malas, gavetas com muitas divisões etc.

Na estrutura psíquica dos taurinos se destaca a secundariedade; os impactos das impressões recebidas tendem a permanecer, a durar, o que os transforma muitas vezes em verdadeiros “ruminantes psíquicos”. Daí, a fidelidade, a constância, a paciência, a perseverança, a teimosia, o rancor e as explosões. A secundariedade faz com que o taurino conserve por muito tempo as impressões recebidas. Os acontecimentos deixam nele marcas, sulcos, que o tornam muito dependente do passado (Lua). Por isso, o taurino persevera tanto na dedicação como no ressentimento. As impressões acumuladas, é muito comum, podem explodir repentinamente, o que às vezes o torna um enigma para as pessoas à sua volta. A secundariedade será mais notável se no mapa houver outros planetas em terra, os pessoais principalmente, ou um Saturno dominante.

Os instintos taurinos estão ligados essencialmente à captação, à absorção (daí a importância da boca da região do pescoço, esta a primeira e mais importante das articulações do corpo humano). Pode-se dizer que o taurino é um instintivo oral, cheio de cobiças digestivas que podem levá-lo a adquirir, a conservar e a aproveitar o mais intensamente possível tudo o que foi absorvido. Nos tipos taurinos, mesmo nos mais bem logrados, encontramos uma espécie de sensorialidade pré-racional voltada no geral para todos os apelos terrestres, para os encantamentos da vida dos sentidos, desenvolvida através de verbos como tocar, apalpar, reter, acumular, uma paixão sensual enfim que tanto dá segurança como subjuga

Em Touro, começa a necessidade. Ideias de quantificação, de limite, de valor, de densidade, de cálculo, de remuneração. As
operações numéricas taurinas estão representadas pela soma, pela   acumulação, pelo investimento seguro (terras, imóveis), operações sempre orientadas pelo seu talento construtivo. Nas expressões inferiores, os taurinos se relacionarão com a avareza, com o conservadorismo, com a possessividades, com a usura, a sovinice, com a inércia, com a inveja.

Diz-se que há três tipos de taurinos: vaca, boi e touro. O primeiro é plácido, maternal, lento, linfático, liga-se muito à comida, gosta de viver sob a proteção de alguém que lhe garanta a subsistência, sendo muito fiel por isso. Sua dominante é fria (Lua-Saturno). O tipo boi é trabalhador, rotineiro, conservador, prefere sempre a segurança a qualquer tipo de risco. Estes dois tipos são propensos à taciturnidade, à melancolia e mesmo ao pessimismo. O terceiro tipo tem uma dominante quente (Marte, Júpiter, Sol, Urano). Seus verbos são construir, levantar, dar forma, conservar, manter, preservar para transmitir às gerações futuras. É hiperemotivo, otimista, excitável, de cóleras temíveis, propenso aos excessos e às explosões.

A constelação de Touro estende-se no zodíaco de 17º Touro – 23º
ALDEBARAN E O SOL
Gêmeos. Ptolomeu atribuiu às estrelas próximas da cabeça (exceto Aldebarã), influências saturninas e parcialmente mercurianas; as que estão nas pontas dos chifres, influências marcianas; as demais, as de Vênus e Saturno. O astrônomo-poeta Marcus Manilius (séc. I dC) apelidava a constelação de Dives Puellis (Rica em Donzelas), uma clara referência às Plêiades e às Híades, grupos de estrelas (asterismos) que dela fazem parte.

A principal estrela de Touro é Aldebarã, alfa, hoje a 9º05´ Gêmeos. Gigantesca, alaranjada, é quarenta vezes maior que o nosso Sol. Era esta estrela chamada pelos para os árabes de A Seguinte, uma das quatro grandes estrelas reais dos persas desde 3.000 aC. Ela está no olho direito  (sul) de Touro e tem características marcianas. Era também chamada de A Guardiã do Leste, marcando o início da primavera quando Touro assumiu a condição de equinocial. Esta estrela aparece citada no segundo trabalho do nosso herói: ele conseguiu localizar o animal enlouquecido na escuridão das florestas por uma estrela semelhante que havia em sua fronte.

Com Aldebarã destacada no mapa, temos propostas de sucesso, de benefícios materiais, mas, ao mesmo tempo, de dilemas morais, de desafios sob o ponto de vista ético, que poderão pôr tudo a perder. Outra estrela (beta) de Touro é El Nath, a 21º53´Gêmeos, situada no chifre norte. A palavra quer dizer, em árabe, o que fere, o que mata. É a ponta do chifre voltada para o ataque. É muito destrutiva. O mapa de Henry Kissinger, um dos maiores assassinos na história da humanidade, permite um bom estudo das influências nefastas desta estrela.

As Plêiades estão situadas nos “ombros” do animal; situam-se no final do signo, podendo ser tomada como longitude média a de sua
principal estrela, Alcyone, a 29º18´ Touro. Além de Alcyone, temos mais seis estrelas: Maia, Electra, Mérope, Taigete, Celeno e Estérope, personagens importantes do mito grego. Desde a pré-história, este grupo de estrelas alimentou a criação de várias histórias míticas nas mais diversas civilizações, em todos os continentes. As Plêiades, com Alcyone (A Paz) à frente, a mais importante, sempre foram vistas como uma espécie de Sol central da Via Láctea.      

A título de curiosidade, lembro que a palavra plêiade passou do mundo greco-alexandrino para o francês medieval e deste para o nosso léxico com o sentido de uma reunião de pessoas ilustres. Na literatura, o nome foi dado a grupos de sete poetas considerados como uma constelação poética. Esta designação foi aplicada pela primeira vez a sete poetas alexandrinos na época de Ptolomeu Philadelpho (séc. III aC). No ano de 1.328, o nome foi aplicado a sete poetas e sete poetisas da região de Toulouse, França. No séc. XVI, o nome voltou a ser usado, designando um grupo do qual faziam parte os poetas Ronsard, Joachim du Bellay e outros.

As Híades, filhas do titã Atlas no mito, formam um pequeno grupo de estrelas situado na testa do animal, onde está Aldebarã, cuja longitude é usada para determiná-las. Nunca tiveram muita importância. Entretanto, seu aspecto nebuloso sempre teve destaque na mitologia, principalmente a grega. Homero já as mencionava. Desde a antiguidade sempre apareceram ligadas à chuva, ao elemento líquido, a tempestades, o que se devia ao fato de seu nascimento heliacal, naqueles tempos.

Entre os gregos, a palavra Híade admite duas etimologias: a) do verbo hyen, chover. b) do substantivo hys, porca, pois a principal estrela vizinha ao grupo é Aldebarã, que vive cercada de estrelas menores e de pouco brilho, o que dá uma ideia de uma porca alimentando os seus filhotes. As Híades são estrelas de nona magnitude, distando da Terra cerca de 150 anos-luz. Já as Plêiades estão a 50 anos-luz. 

A era cósmica de Touro se estendeu mais ou menos de 4.000 a 2.000 aC (matematicamente, entre 3.822-1.662 aC), Foi durante esse período que na história da humanidade se evidenciou, como jamais acontecera, o simbolismo do touro para representar as forças fecundantes do mundo natural e cristalizadoras de formas,
APIS
ocorrendo nessa era a unificação do Alto e do Baixo-Egito. Quando Menés, o primeiro faraó egípcio historicamente determinado, promoveu essa unificação, ele a fez em nome do culto ao deus Hapi ou Apis (transcrição grega), deus representado por um de touro. Este culto estava centralizado em Mênfis, onde aparecia associado ao deus Ptah, deus dos artesãos e dos artistas, identificado pelos gregos com o seu Hefesto.

Numa grande síntese religiosa, os egípcios ligaram o touro, ao mesmo tempo, a ideias de fertilidade, de morte e de renascimento. É sob esta perspectiva que aparece entre os gregos o deus Dioniso, ligado ao signo de Touro. Animais como o touro e o bode, como se sabe, faziam parte do bestiário do deus, aparecendo ambos como vítimas propiciatórias no seu culto. Deus das forças incontidas do mundo natural, da vinha, da exuberância da vida vegetal e animal, Dioniso era, por excelência, o deus renovador, o deus das metamorfoses. Seu culto significou, com base nestas ideias, uma das maiores tentativas feitas pelo homem grego no sentido de destruir as prisões materiais nas quais ele mesmo se encerrava (Mistérios de Eleusis). “Sacrificar o touro” era a expressão que então se usava para designar a busca de uma vida na qual as paixões materiais não pesassem tanto ou fossem contidas.

Foi durante a era de Touro, em toda a antiguidade, que o touro, como grande totem, apareceu muitas vezes unido ao da vaca sagrada, no Egito, na Índia, na Pérsia, entre os assírios, babilônicos, caldeus, nórdicos, e muitos outros, inclusive para os povos que vivem na região equatorial da Terra. É bom lembrar que o mais importante objeto celeste para os indígenas do norte do Brasil estava localizado na constelação de Touro, o asterismo das Plêiades. Por ele se anunciava a chegada da primavera e tudo começava a se renovar.

Está hoje comprovado, por exemplo, que foram as três estrelas do chamado cinturão da constelação de Orion/Osíris, Mintaka, Alnilan e Alnitaka, que serviram de base para que os construtores reais alinhassem e definissem a posição das pirâmides de Keops, Kefren e Mikerinos. Por volta de 6.500 aC, a constelação de Orion/Osíris
ORION
marcava o início do equinócio da primavera; era, como tal, uma constelação heliacal, que vinha com o Sol, precedendo-o. Pelo fenômeno da precessão dos equinócios, cerca de dois milênios depois Orion/Osíris começou a perder esse status. Essa perda, como se sabe, significou uma profunda mudança na religião egípcia. No mito, Osíris foi “assassinado” por seu irmão Seth, mas tendo ressuscitado por artes de Ísis, sua irmã e esposa, desceu ao mundo dos mortos, onde pontifica como deus dos renascimentos.

O lugar de Osíris foi assumido por Hórus, seu filho; com ele, a constelação de Touro se transformou, por volta de 4.000 aC, no marco inicial do equinócio da primavera. Durante este novo período equinocial, a passagem de Orion para Touro, apareceram no mundo antigo muitas divindades sob a encarnação taurina. Urano, Zeus e Poseidon, na mitologia grega, aparecem em muitas histórias sob a forma taurina. O deus fenício chamado “pai dos
TAUROBOLIUM
homens” tinha o título de El, palavra que quer dizer touro. É neste contexto que, mais tarde, a cerimônia do taurobolium (sacrifício do touro, batismo com o seu sangue), com Mitra, herói solar e militar (muito sedutor para as legiões romanas), nos sinalizará que uma nova era estava se aproximando (era de Áries: 1.662 aC – 498 dC). Com esses novos tempos, uma polaridade sexual, psíquica e religiosa logo se instalou entre o feminino (touro) e o masculino (cavalo), enquanto a figura do primeiro evocava tanto o aspecto maternal da natureza (grandes-mães) como as suas temíveis manifestações.

Não será possível encerrar esta nossa digressão sobre o segundo trabalho de Hércules e a constelação de Touro sem uma referência explícita a uma constelação que deve ser sempre citada quando se fala do segundo signo zodiacal. Refiro-me à constelação de Perseu
CAPUT MEDUSAE
(8º Touro – 8º Gêmeos), principalmente por causa de sua estrela beta, Algol (25º28´ Touro), chamada pelos árabes de Ras-al-Ghul (Caput Medusae), cujas influências, atestadas desde a mais remota antiguidade, falam de paixões devoradoras, violentas, intensas. Essa estrela pressupõe a liberação de formas de energia, que podem tomar um caminho altamente destrutivo ou construtivo. Lembro, por exemplo, numa expressão positiva, que Albert Einstein tinha Algol culminando com o seu Júpiter. Foi através de seus trabalhos que o homem aprendeu a liberar o tremendo poder contido nos átomos. Adolf Hitler, outro exemplo, tinha esta estrela se pondo, juntamente com o seu Sol.