terça-feira, 8 de janeiro de 2019

AQUÁRIO (4)

                         
CONSTELAÇÃO   DE   AQUÁRIO
           
Entre os gregos, a origem do signo de Aquário aparecia ligada principalmente ao mito de Ganimedes. Este nome, em grego, é composto de ganos, líquido brilhante, como o jorro do vinho escapando dos tonéis, e medesthai, verbo que traduz uma ideia de ocupação, de atividade. Ganimedes, “o amado dos deuses”, era o que se ocupava da distribuição do néctar (nektar, em grego, bebida dos deuses), distribuindo-o nos banquetes olímpicos.Transposta essa ideia para os planos terrestres, o vinho tomou o lugar do néctar, palavra que passou a significar qualquer bebida deliciosa. É por essa razão que praticamente em todas as tradições religiosas mediterrâneas em especial e europeias e ásio-menores, em geral, há sempre uma bebida de caráter enteógeno, mais à base do vinho, que transforma o mortal comum num ser religioso.


RAPTO  DE  GANIMEDES, PORTO, PORTUGAL
 (FERNANDES SÁ, 1874 - 1959)

Ao proporcionar a embriaguez divina, o vinho, como os cultos dionisíacos nos mostram, oferece aos que o consomem uma existência sobre-humana e atesta neles a presença real da
EUCARISTIA
divindade. É ainda nesse sentido, quando a história de  Cristo, que viveu uma paixão e uma ressurreição,  que o mito de Dioniso pode ser evocado, quando o deus grego declarou que era a cepa. As imagens se unem então no cristianismo: a seiva como a Luz do Espírito, o fruto como a eucaristia e o vinho como o sangue de Cristo.

Na epístola aos coríntios, por exemplo, S.Paulo, um aquariano, ao discorrer sobre o significado da ceia ritual judaica à qual Jesus imprimira um novo sentido, a Santa Ceia, fala que o cálice da bênção e que o pão partido eram, respectivamente, solidariedade com o sangue e com o corpo de Cristo. Ambos eram solidariedade com o corpo de Cristo, porque os que do banquete participavam transformavam-se num só corpo. Quem participava do banquete sacrificial tornava-se solidário com todos. Todas estas ideias nos apontam para um fundo comum mítico, astrológico (aquariano) e religioso ao qual cada cultura deu um tratamento particular, específico.


SANTA  CEIA ( PHILIPPE  CHAMPAIGNE , 1602 - 1674 )

A figura de Ganimedes sempre apareceu associada a banquetes, refeições aparatosas e com muitos participantes. Os banquetes, na antiguidade greco-romana, lembremos, significavam a participação num rito, num projeto ou numa festa que caracterizava o lugar de sua realização como um espaço de trocas onde a distinção de classe ou de raça podia ser superada (outro tema caro a Aquário), compartilhando-se não só a comida. Os primeiros cristãos adotaram o nome grego ágape (banquete) para designar o rito eucarístico, a comunhão, através do qual partilhavam a mesma graça e a mesma vida. Às refeições comuns também era dado o nome de ágape, adquirindo também o termo o sentido de caridade.

Ganimedes, no mito grego, era um belíssimo jovem, que exercia a função de pastor, tomando conta dos rebanhos do pai, Trós, numa versão, e de Laomedonte noutra. O primeiro, conforme Homero (Íliada), era o ancestral epônimo da raça troiana, casado com a mãe do jovem, Calírroe, uma filha do deus-rio Escamandro. Laomedonte era um rei da antiga Troia (Troada e Dardânia), casado com várias mulheres. Laomedonte teve inúmeros filhos, destacando-se dentre eles Podarces (futuro rei de Troia, com o nome de Príamo), Hesíona e Ganimedes. 

Na versão em que Laomedonte é tido como pai de Ganimedes, consta que ele recebeu, como presente de Zeus, para se consolar pela perda do filho, através de Hermes, dois cavalos maravilhosos, nascidos do sêmen do vento Zéfiro e de uma das Harpias, cavalos que, devido à sua espantosa velocidade, podiam galopar sobre as águas. Prometeu mais ao pai do jovem que o imortalizaria, o que fez, colocando-o nos céus entre as constelações do Zodíaco.
GANIMEDES  SERVE  VINHO  A  ZEUS / ÁGUIA
Qualquer que seja a versão sobre a paternidade do jovem, o que fica do mito é que, notado pelo Senhor do Olimpo, deslumbrado pelo seu esplendor físico, Ganimedes foi raptado por ele na forma de uma águia, perto de Ílion, e levado para a mansão olímpica. Conforme já exposto quando tratamos das constelações boreais, Aquila tem a ver com a forma alada tomada por Zeus para raptar o jovem Ganimedes. Essa constelação estende-se de 12º Capricórnio a 15º Aquário, sendo sua principal estrela Altair, de 1ª magnitude, atualmente sensibilizando o grau 1º04´ desta última.



A  ÁGUIA  E  GANIMEDES

Ganimedes tornou-se, assim, o escanção (servidor de bebidas) dos deuses e também escravo erótico de Zeus, substituindo Hebe (filha de Zeus e de Hera) na primeira função. Para celebrar o acontecimento, Zeus, instaurando no mito uma das práticas mais vezeiras nas relações homossexuais (presentes dados pelo erasta ao pupilo), ofereceu ao jovem um aro (anel), símbolo da união; um galo, ave que espanta as trevas noturnas ao anunciar a aurora; e um par de asas, símbolo de elevação. O galo, como se sabe, por suas características solares, é também um poderosos amuleto contra pesadelos. Foi nesta condição, de um ser alado, celeste, que Ganimedes passou a desempenhar as suas funções de escanção nas reuniões olímpicas. É nesta representação algo andrógina,angelical,que o jovem troiano, imortalizado por Zeus, seria colocado depois, como se disse, no Zodíaco entre os signos de Capricórnio e de Peixes.

Toda a história de Ganimedes, como se pode constatar sem muito esforço, é um relato sobre muitos temas que fazem parte do universo aquariano. A palavra escanção, como sabemos, não é de origem grega. Foi introduzida no nosso léxico a partir do gótico, skanja, do céltico, escanzaria, do alemão, schenk, ou do baixo francês pelo latim medieval, skankjo, segundo as várias hipóteses sobre a sua origem.O banquete, entre os gregos antigos, era realizado em muitas ocasiões, como sabemos, nas festas de casamento, nas cerimônias fúnebres e nas reuniões sociais e culturais. Nestas últimas, de modo especial, o banquete se integrou à filosofia como uma reunião durante a qual os convidados bebiam vinho e sobretudo conversavam sobre temas variados, filosóficos. Este banquete era chamado de symposion (posis, em grego, é ação de beber, gole de bebida), sendo presidido, dirigido, por um “symposiarkhes (simposiarca), encarregado de manter as conversas “acesas”, dosando, para isso, o teor alcoólico do vinho distribuído entre os convivas. Em Portugal, usa-se a palavra escanção para designar o profissional dos vinhos em restaurantes, incluída a
SOMMELIER
responsabilidade pela cave. No Brasil e no resto do mundo, a palavra usada para o desempenho dessa função é sommelier. Esta palavra, etimologicamente, quer dizer “encarregado das bestas de carga”. Depois, o nome foi aplicado àqueles que exerciam a função de supervisionar a mesa, os víveres e as bebidas numa comunidade. Na figura do escanção unem-se duas ideias caras a Aquário, banquete, participação comunitária, e circulação de energia (vinho) que a todos una. 

O vinho enquanto “sangue” da vinha nos remete a uma ideia de princípio vital considerado sob o ponto de vista espiritual, isto é, da totalidade. Assim como o sangue através da circulação arterial energiza os órgãos do corpo, fazendo-os funcionar corretamente em
DIONISO ( CARAVAGGIO , 1571 - 1610 )
benefício do todo, assim o vinho, bebida da imortalidade leva à transcendência do individual em direção do coletivo, da humanidade, do todo. Astrologicamente não nos esqueçamos que Urano, regente de Aquário, se exalta em Escorpião, signo no qual “vive” o deus Dioniso, o “inventor” do vinho. Aliás, o vinho em todas as tradições sempre teve também um valor cultural superior, favorecendo, àqueles que sabem consumi-lo, uma forma de convívio inteligente, culta. 

SYMPOSION
É nesta perspectiva que se coloca a obra (diálogo) de Platão, de modo especial o seu Symposion, O Banquete, em português (péssima tradução), que tem por cenário uma reunião patrocinada pelo poeta Agathon, da qual participam os seus amigos. Nessa reunião são abordados os temas do amor à ciência e ao belo. Cada um dos convivas faz um elogio ao amor, tomando Sócrates depois a palavra para fazer um elogio à beleza e uma reflexão sobre o amor aos belos corpos e às belas almas, depois às belas obras humanas, às belas-artes, à ciência e, por fim, à vida espiritual superior.

O “líquido” que hoje circula nos meios aquarianos nada tem a ver com aquele a que o mito se refere. O “verdadeiro” líquido aquariano significava então aproximação, contacto, união, presença, que não anulava as individualidades, mas que levava a uma participação comunitária. A energia aquariana, no seu mais
WORLD  WEB  WILDE
alto grau de eficiência, circula hoje, como sabemos, na Internet, formando uma rede mundial de computadores interconectados (WWW-World Web Wilde), que parece unir os que a usam, todos “linkados”, mas que, no fundo, os separa cada vez mais (outra contradição aquariana), vivendo todos numa “realidade” fragmentada de informações, sem nenhuma possibilidade de controle do todo. 

A relação entre a futura era de Aquário e a homossexualidade é um dos temas mais explorados pela cultura moderna, tanto a erudita como a de massa, como todos podemos constatar, principalmente com relação a esta última. Teatro, música, cinema, artes plásticas, desfiles, paradas, espetáculos, tudo foi permeado. Muito do que se produziu nessas áreas, inclusive na cultura erudita, acadêmica, tem como ideia básica a proclamada “homossexualidade dos antigos gregos”. Temos, contudo, que ter muito cuidado quando nos aproximamos dessa “unanimidade” que veio dos gregos. Até que ponto a antiga sociedade grega era realmente permissiva com relação à prática homossexual?

É claro que encontramos diversas demonstrações dessa forma de desejo, presentes não só na mitologia, na arte, na filosofia, na poesia, no teatro, na cerâmica e nos grafites gregos. É o caso de que
AQUILES   E   PÁTROCLO
ora tratamos, o rapto de Ganimedes por Zeus, transformado por ele em seu escravo erótico no Olimpo. Se nos voltamos para Homero, lá temos Aquiles e Pátroclo, heróis da Ilíada, vivendo uma comovente e delicada relação homoerótica. Sócrates (ou Platão?), já sexagenário, transforma a pederastia em pedagogia, iniciando o belo Alcebíades nos prazeres da carne e do espírito. Platão, Aristóteles, Alexandre Magno, Aristófanes, Epaminondas, Sófocles e outras importantes figuras históricas do mundo grego foram praticantes do amor unissexual conhecido também ao longo dos séculos como “amor grego”, “amor dórico” ou “amor socrático.”

Além disso, quando falamos da Grécia devemos lembrar que sua história se estende por cerca de 2300 anos, desde a chegada das tribos indo-europeias ao seu território até o denominado período romano. O que temos de mais consistente e sério sobre a homossexualidade grega nos vem da produção de uma elite cultural, os chamados helenistas, que se voltou sobretudo sobre o período clássico da história grega, cerca de 150 anos, dentro da qual está o período em em Péricles governou, entre os séculos V e IV aC., quando Atenas era por excelência a polis grega. 

No mais, quanto ao homem comum, ao longo de todos os demais séculos, a homossexualidade parece não ter sido unanimemente aceita. Havia em muitas cidades gregas legislação que punia até pesadamente a prostituição de um modo geral, inclusive a masculina. Não podemos esquecer por outro lado que a maioria dos scholars (os ingleses do período vitoriano, principalmente (segunda metade do séc. XIX e princípio do séc. XX) que se voltou para o estudo da homossexualidade grega era homossexual e procurou “dourar” de algum modo a sua abordagem, muito erudita sempre, revestindo-a às vezes até de grande charme, com farta riqueza de informações.


AQUÁRIO, ILUMINURA MEDIEVAL
As asas de Ganimedes explicam que o fluxo de Aquário não é líquido, mas aéreo, etéreo, lembrando as suas “águas” o oceano fluído que envolve o planeta Terra, com os seus variados tipos de ondas eletromagnéticas, regiões, níveis e frequências. Aquário, por isso, se liga ao fluído, ao volátil, à elevação, à emancipação, ao afastamento dos planos terrestres. Ganimedes, por sua vez, implica ideias de distribuir, de fazer circular o “líquido” da imortalidade (o vinho, recomendado por cardiologistas), para que sejam estabelecidas formas superiores de vida, fraternidade, altruísmo e igualdade. No corpo humano, lembramos, esta função cabe aos vasos sanguíneos, sendo os mais importantes as artérias, fortes e flexíveis, que transportam o sangue oxigenado no coração, distribuindo-o pelo corpo. Dentre as artérias, a principal, como sabemos, é a aorta, que no nasce no ventrículo esquerdo do coração. Astrologicamente, como se sabe, o coração é do signo de Leão, sendo as artérias governadas pelo signo de Aquário, oposto àquele.

Se astrologicamente a história de Ganimedes tem relação como o elemento ar, alquimicamente ela se relaciona com a sublimatio, palavra que indica elevação, movimento ascendente, como, aliás, a figura alada, o anjo, que representa o signo, sugere. É neste sentido que o anjo é uma das melhores representações do aquariano espiritualizado. 

Em todas as tradições, no antigo e no novo testamento, nas teorias religiosas egípcias, persas, indianas ou chinesas, por exemplo, encontramos a crença em seres espirituais superiores à natureza humana. A criação, segundo essas teorias, é concebida numa gradação em que o topo, imediatamente abaixo dos deuses, é ocupado por esses seres de substância incorpórea, espíritos puros, enquanto os humanos, duplos, são formados por matéria e espírito, corpo e alma, vivendo presos à Terra.

As características de leveza, souplesse, facilidade para se deslocar através de impulsos para diante e para cima a partir de um movimento peculiar dos tornozelos, faz com que o andar de muitos aquarianos (principalmente os que têm o ascendente no signo) lembre às vezes uma vitória sobre as forças da gravidade. Os tornozelos, segmentos ósseos em cada um dos membros inferiores, situados entre a perna e o pé, são conhecidos desde a antiguidade como o “segundo coração”, já que por eles é possível avaliar em que condições está a circulação arterial de alguém.


Particularmente importante no tornozelo é um ligamento (correia de transmissão do sistema locomotor) chamado tendão de Aquiles, que realiza a inserção dos músculos posteriores da perna sobre o calcâneo. O poder de impulso está nele, do qual dependem os saltos, sendo um símbolo da ascensão, da elevação. Aquiles, o maior dos guerreiros da mitologia grega, invencível, modelo do infante, o que combate a pé), um dos mais acabados tipos astrológicos arianos, como se sabe, tinha como ponto vulnerável no seu corpo este ligamento, o mais forte do corpo. Os gregos e os romanos antigos viam uma analogia entre asas e tornozelos. Ambos lembram desmaterialização, ultrapassagem, liberação, transcendência. O deus Hermes tinha pequenas asas nos tornozelos, razão pela qual superava qualquer obstáculo que encontrasse, transpondo-o. Astrologicamente, as asas de Hermes nos tornozelos significam não só a capacidade de deslocamentos rápidos mas força de elevação (exaltação de Mercúrio em Aquário). 

 
AQUILES  FERIDO .  ESTÁTUA  NOS  JARDINS  DO  ACHILLEION

Segundo o ensinamento da Angeologia, os anjos foram criados em um estado de graça, de felicidade e com a liberdade de escolher entre o bem e o mal. Alguns, como temos no cristianismo, por exemplo, pecaram por orgulho e foram condenados a um suplício eterno; transformaram-se em demônios, seres que empurram os humanos na direção do mal. Cada ser humano é ajudado na via do bem por um anjo da guarda, chamado também de custódio, símbolo da consciência superior. Simbolicamente, os anjos são potências
LUDWIG KNAUS
1829-1910
invisíveis e correspondem na escala dos valores humanos aos mais altos, à mais elevada espiritualidade, pois podem frequentar a região etérica, onde vivem os deuses. Num nível muito abaixo, nessa escala de valores, mergulhados no mundo da matéria, que a Lua separa da região etérica, sem liberdade alguma, portanto, sujeitos às pressões dos seus corpos mental, emocional e físico, encontramos o resto da humanidade. A iconografia representa os seres que estão no topo da referida escala com asas, testemunhando sua essência imaterial, geralmente com vestes brancas, talares. Os demônios, lembremos, sob o ponto de vista psicológico, representam no ser humano as suas funções inferiores, agindo na sombra do inconsciente.

SUBLIMATIO
A sublimação alquímica, sempre vivida simbolicamente, é experimentada por muitos aquarianos através de imagens ascensionais, segundo a posição que ele ocupe na escala de valores do signo a que estamos nos referindo. Quanto mais espiritualizado o aquariano, mais o “angelical” o domina, menor o poder da matéria, passando ele a viver num plano de abstrações, deixando, como dizia Schopenhauer, de lutar, sofrer e morrer como um animal. Esta ascensão permitirá que ele se situe acima das coisas mundanas, adquirindo assim a habilidade de dissociar, de discriminar. Nem sempre, porém, esta sublimação “angelical” é atingida. Daí encontrarmos muitos aquarianos, conforme o nível que ocupem na referida escala, repetimos, “vivendo” os seus símbolos através de atividades que impliquem alguma forma de elevação, trabalhando no mundo da aeronáutica (militares da força aérea, empregados em empresas de aviação, maníacos por naves espaciais, aviões, zepelins, foguetes, balões, planadores, filmes, ficção científica, literatura etc.) Nas expressões inferiores do lado “angelical” comum a tendência aparecer através de colecionadores de anjinhos, de modelos de aviões, de foguetes etc. 

Tudo o que libera o homem, elevando-o do solo ou levando-o a percorrer horizontalmente toda superfície terrestre, rompendo fronteiras e limites, indiferenciando-o, individualizando-o ao máximo, se liga de algum modo a Aquário. Nestes casos, porém, há sempre o perigo do aquariano inflar demasiadamente o seu ego (leonino), sonhando alto demais, ou de não dominar adequadamente os meios técnicos que emprega para a sua ascensão. São estas duas configurações que costumam dar origem a duas grandes distorções em tipos do signo, gerando o aprendiz de feiticeiro e o delirante.


O  GOLEM  COMO  VEIO  AO  MUNDO
FILME  DE  PAUL  WEGENER , 1920

O primeiro, como se sabe, costuma precipitar tragédias, como no caso já descrito do Golem, pela busca de metas “impossíveis” ou pela inabilidade ou desconhecimento quanto ao uso das técnicas disponíveis tendo em vista o fim colimado. Já o segundo tipifica o aquariano que sofre do chamado delírio sistematizado, sistema logicamente organizado de ideias delirantes, que se instala sem sinal claro de demência, no qual grande número de funções perceptivas e cognitivas pode permanece intacto, mas ativados em níveis que parecem querer (ou querem mesmo?) ultrapassar os limites do humano. As manifestações deste segundo tipo podem ser detectadas em várias expressões aquarianas, mais ou menos logradas, expressões que elegem símbolos de caráter ascensional,como o da águia, por exemplo. 

A união da águia com a proposta visionária aquariana, com o objetivo de antecipar de algum modo o futuro, traço aquariano notável, nós a encontramos na atividade dos áugures do mundo greco-latino que traduziam o voo e o canto da águia em profecias. O delírio poético que tem no chamado condoreirismo (uma distorção do Romantismo, movimento artístico tipicamente aquariano) uma de suas mais pomposas, grandiloquentes, bombásticas e banais elaborações é também um bom exemplo.

Como traço de personalidade, o delírio aquariano tem um dos seus exemplos mais interessantes na tendência que muitos do signo apresentam no sentido de compensar a sua “fraqueza” solar (o Sol se exila em Aquário), que os faz sentirem-se inferiorizados por alguma razão (sentimentos sempre geradores de medo e ressentimentos reprimidos), por uma supercompensação, na linguagem psicanalítica. É isto que leva muitos aquarianos enquadrados neste exemplo para o outro polo. Vão de um disfarçado complexo de inferioridade (o de não serem “bons” em alguma coisa, uma limitação física, um problema de relacionamento, um mental não à altura de suas pretensões) para um complexo de superioridade. Procuram ser os melhores em alguma atividade (baterem recordes, se tornarem “únicos”, 
URANO

paradigmas, excêntricos etc.), superarem alguma marca, limite, no fundo sempre uma defesa contra o complexo oposto. É isto que aproxima tão perigosamente o sábio solitário (aquariano superior) do louco, igualmente solitário, perdido nos seus delírios paranoicos (lembremos que o símbolo de Urano é construído com duas Luas). 

Partindo destas considerações é que podemos ver Diógenes, o Cínico (413-327),como um dos  mais perfeitos tipos aquarianos da história da filosofia. A tradição nos fala de seu espírito cáustico, de seu desprezo pelas honras, pelas riquezas e por todas as convenções sociais, e da sua busca por uma vida sóbria e natural. Pés nus e envolvido por uma túnica, sua única vestimenta, vivia dentro de um grande tonel, símbolo evocador de abundância, de espontaneidade, sempre associado à palavra grega ganos, jorro do vinho. Tendo visto um menino beber na concha que fazia com uma das mãos, quebrou Diógenes a única tigela que possuía, alegando que o garoto lhe dera uma grande lição sobre o que era supérfluo na vida. 

A Alexandre Magno, que, curioso, o procurara em Corinto, perguntando-lhe o que ele desejava na vida, que ele tudo lhe daria, pediu apenas ao imperador que se afastasse um pouco de sua frente
 DIÓGENES
(ANTÔNIO ZANCHI, 1631-1722)
para que pudesse, sentado como estava, continuar a receber a luz do Sol. Famosos eram os seus passeios por Atenas quando, à luz do dia, com uma lanterna mão, saía, segundo dizia, para procurar “um homem.” Os cínicos, como se sabe, usavam de forma polêmica a vida canina (kyon, kynis, cão, em grego) como um modelo prático de virtudes, descaso pela vida social e moral vigente, espontaneidade, desfaçatez, despudor.