domingo, 2 de outubro de 2011

MITOLOGIAS DO CÉU - O SOL - ( 2 )




Embora os cultos solares ocupassem um lugar importante na Mesopotâmia, eles nunca tiveram o esplendor que os egípcios lhes deram. Shamash, o deus Sol, era para eles filho de Sin, a deusa da Lua, e irmão de Ishtar, a deusa do planeta Vênus. Os três formavam a grande tríade astral da mitologia assiro-babilônica, que tinha em sua base o legado sumério e acádio.

SIN E SEUS FILHOS (SHAMASH, esq., E ISHTAR, dir.)

Os principais centros do culto a Shamash ficavam nas cidades de Sipar e Larsa. Era Shamash o deus da justiça e das profecias, aparecendo como o grande protetor do herói Gilgamés e muito tempo depois (cerca de dois mil anos) inspirador do rei Hamurabi quando, por volta de 1750 aC, ele elaborou o primeiro código de leis conhecido pela humanidade. Hamurabi foi o sexto rei da dinastia amorita e verdadeiro fundador do primeiro império babilônico.

MARDUCK LUTANDO CONTRA TIAMAT

A cada manhã, os homens-escorpião, filhos de Tiamat, o oceano primordial, imagem do caos, irmãos de outros monstros, dragões, gênios das tempestades, homens-peixe etc., que habitavam as montanhas do leste e as defendiam, abriam nos seus flancos a enorme porta para dar passagem ao deus. Shamash é frequentemente representado ao se movimentar entre duas montanhas, de leste a oeste, símbolos dos limites do mundo ou, de outro modo, como também os mesopotâmicos as viam, símbolos das polaridades do psiquismo humano. É por essa enorme porta que o deus se lança no seu curso diurno; raios luminosos parecem sair de seus ombros; na sua mão, um objeto semelhante a uma lâmina na qual alguns vêem a chave que abre a porta do oriente. Ao avançar, ele entra no seu carro, conduzido por um cocheiro, que o espera. Numa explosão de luz, Shamash começa nos céus a sua grande ascensão. Ao entardecer, ele toma a direção da grande montanha do oeste. Uma porta se abre e ele penetra nas profundezas da Terra. Desaparecendo, Shamash continua a sua marcha, agora no mundo subterrâneo, a fim de atingir, antes da aurora, a montanha do leste.


ASTROMANCIA

As principais características de Shamash são o vigor e a coragem, características que o faziam triunfar sobre a noite e a superar os invernos. Sua formidável luz era servidora da justiça, pois ele afastava as trevas, tão propícias ao crime. Além de ver tudo, seus raios formavam uma espécie de vastíssima rede que acabava alcançando todos aqueles que praticavam iniquidades. Como mais tarde Apolo, deus solar entre os gregos, Shamash era o deus da mântica profética. Era ele quem, através de um médium, o “baru”, revelava aos homens os segredos do futuro. Depois de ter feito um sacrifício ao deus, o médium: a) observava as formas diversas que tomava o óleo (elaionmancia) lançado sobre a água; b) examinava o fígado das vítimas sacrificadas (hepatoscopia); c) examinava a posição dos astros, o movimento dos planetas ou o aparecimento de meteoros (astromancia). A arte da adivinhação florescia sobretudo na cidade religiosa de Sipar. Juntamente com Shamash, era reverenciada a sua esposa Aya, formando o casal, nesta circunstância, um par que pontificava, a primeira, sobre a Justiça e, o segundo, sobre o Direito.

Entre os fenícios, os seres divinos eram concebidos como uma expressão antropomorfizada dos elementos e dos fenômenos naturais, organizados segundo uma rigorosa hierarquia. Os fenícios fazem parte do mundo cananeu, constituído este, desde a aurora dos tempos históricos, por uma migração de semitas que se fixaram entre o mar Mediterrâneo e os desertos da Síria. Os semitas formam um grupo étnico e linguístico que, conforme se acredita, tem como ancestral Sem, filho de Noé, nele incluindo os hebreus, os assírios, os aramaicos, os fenícios e os árabes. A mitologia semita deriva, por sua vez, de um fundo comum grandemente espalhado entre todos os povos do Oriente próximo.


NOÉ E SEUS FILHOS

El era o nome da grande divindade solar venerada por todos os semitas ocidentais, desde tempos muitos recuados, ocupando o primeiro lugar no panteão desses povos. O país de Canaã estava totalmente sob a sua tutela. Canaã era um personagem bíblico, filho de Cham, maldito pelo avô, Noé. Era Canaã o ancestral epônimo dos cananeus. O nome estendeu-se à Fenícia (Palestina), a Terra Prometida, “país do leite e do mel”, que os judeus conquistaram entre os sécs. XII e XI aC.


TOURO - EL

Era El quem fazia com que os rios se lançassem nos abismos oceânicos, que promovia a fertilidade das terras. Era chamado de “pai do ano”, cujo curso regulava, situando-se o seu palácio nos confins do oceano. Era honrado de diversas maneiras, sendo chamado de Touro-El ou simplesmente Touro, por causa da sua força e do seu poder. Seu grande inimigo era o deus Baal, divindade que não tinha a sua ancestralidade, pois fora trazido pelos fenícios que passaram a ocupar o litoral, vindos do sul da Palestina.


RAS SHAMRA


Estas informações mitológicos provêm de pequenas tabuletas, em escrita cuneiforme, achadas em Ras Shamra, datadas do séc. XIII aC., que arqueólogos encontraram perto de Ugarit. Este deus Baal, inimigo de El, era chamado de Tsaphon, “Senhor do Norte”, ou de Baal Lebanon, Senhor do Líbano, venerado nas montanhas libanesas. Os registros arquelógicos de Ras Shamra nos informam que Mot, um dos filhos de El, era o espírito das colheitas. Dominava ele os campos durante o período em que as terras estavam ressecadas ao extremo pelo calor proveniente dos céus por obra divina.

BAAL

No tempo das colheitas, devido à intervenção da deusa Anat, deusa virgem, filha de Baal, Mot é sacrificado. Participa também desta luta contra Mot o outro filho de Baal, o deus Aleyin. Um dos poemas de Ras Shamra narra o conflito entre Mot e esta última divindade, deuses da vegetação, uma luta que se renova anualmente. Aleyin é “aquele que cavalga as nuvens”, tem um séquito, sendo acompanhado também por animais (javalis). Espírito das fontes, Aleyin favorece o mundo vegetal, que se desenvolve no período das chuvas. Anat, divindade de temperamento combativo, tem por emblema o leão, cabendo-lhe conduzir anualmente o sacrifício ritual de Mot.


Entre os judeus, Deus se deu a conhecer pelo tetragrama YHVH (Yahweh), pelo qual o Eterno se revelou no antigo testamento. A tradição rabínica, como se sabe, proíbe que estas quatro letras sejam pronunciadas, pois sua pronúncia original se perdeu, provavelmente depois que Moisés as ouviu no Sinai. Segundo o gênesis, capítulo primeiro, depois de ter criado a luz e as trevas, Deus “fez os luzeiros no firmamento do céu, que dividiram o dia e a noite, e que serviram de sinais para mostrar os tempos, os dias, os anos.”

Assim, o Sol foi criado para ser o regente do dia e para separá-lo da noite, recebendo, em hebraico, o nome de “Chamá” ou “Shemesh”. Não obstante a Lua ser considerada com o principal símbolo dos judeus, que adotam um calendário nela baseado, do qual depende a sua vida como um todo, o Sol, símbolo dos gentios, tem “alguma” importância. A começar porque os eclipses do Sol serão sempre um indício de má sorte e de dificuldades para os que não são judeus. A cada vinte e oito anos, há uma cerimônia judaica, a bênção do Sol (birkat ha-chamá) no início do mês de Nissan (primeiro mês do ano judaico, indo do meio de março a meados de abril), quando Sol volta a ocupar a posição que ocupava no céu quando foi criado inicialmente. Na era do Messias, deus removerá do Sol a sua cobertura e seu calor queimará os iníquos, mas, entre os justos, curará os doentes. Esta afirmação se apoia em palavras de profeta Malaquias (meu mensageiro, etimologicamente).

De acordo com o Talmud, o Sol é essencialmente branco, mas parece vermelho porque, pela manhã, quando se levanta, seus raios se refletem nas pétalas de rosas do jardim do Éden: à tarde, quando se põe, eles se refletem nas labaredas do inferno. O Sol, na doutrina judaica, representa essencialmente o aspecto masculino da criação. Para os judeus, aqueles que nascem durante o dia, enquanto o Sol brilha, serão capazes de se manter por si mesmos, não dependerão dos outros para o seu sustento.

No tempo do Messias, o Sol deixará de ser útil porque, segundo Isaías (60:19), “Tu não terás mais o Sol para luzir de dia, nem o resplendor da Lua te alumiará; porém o Senhor te servirá de luz sempiterna e o teu Deus será a tua glória.” Este tema, aliás, é retomado no segundo testamento, no Apocalipse (21:23): “E nesta cidade não há de mister Sol nem Lua que alumiem nela, porque a claridade de Deus a alumiou e a lâmpada dela é o cordeiro.”

CAF

Entre os judeus, o Sol é o regente do quinto signo, chamado Av, palavra que significa pai. Seu símbolo é o leão, uma das quatro entidades sagradas (o touro, a águia e a humanidade são as demais). As energias que fazem a ligação com o mês de Av são representadas pela letra Kaf, que criou o Sol (Tet criou Av). O Kaf representa a coroa, a realeza, o equilíbrio, a integridade. O Tet representa o órgão sexual. Quem fornece a energia para Av é o Sol. Há que se lembrar, entretanto, que os judeus, segundo a Cabala, consideram o mês de Av como muito negativo, pois quanto mais positiva a energia existente no universo, o caso deste mês, mais forte é a sua negatividade. Quanto mais brilhante o Sol, maior o potencial para as queimaduras e incêndios.

Lembro que tradições orientais como a hebraica e a islâmica atribuem às letras do seu alfabeto um valor mágico-sagrado. È a gematria, que basicamente podemos considerar como uma regra hermenêutica que consiste em explicar uma palavra ou conjunto de palavras pela atribuição de um valor numérico convencionado a cada letra. Associadas aos planetas para constituir pentáculos (tratados de magia ou selos que se imprimiam em pergaminho de pele de bode, ou se gravavam em metal precioso, e que se relacionavam com forças poderosas e invisíveis) protetores, elas atraem ou repelem influxos planetários errantes em torno do gerador fluídico assim criado. A Cabala desenvolveu uma ciência que estabelece um sistema de analogias com as 22 forças ou correntes em movimento que o ser humano recebe ou envia, análogas às da natureza.