sábado, 11 de junho de 2011

NOITES BRANCAS




O filme é de 1957, produção italiana, dirigido por Luchino Visconti, responsável também pelo roteiro, tendo por base uma história (conto) de Fyodor Dostoievski. Estrelam o filme Maria Schell, Marcello Mastroianni, Jean Marais e Clara Calamai. A música e a fotografia, sempre excepcionais, são respectivamente de Nino Rota e de Giuseppe Rotunno.

Um jovem solitário, Mário, recém-chegado à cidade (Livorno, no filme), conhece uma mulher, Natália, que, à noite, anda pelas ruas do bairro em que mora, esperando o retorno do homem que ama. Mário fica sabendo que esse homem alugara um quarto na casa em que viviam a moça e a avó. Ambas ganhavam a vida consertando tapetes. A ingênua Natália se apaixonara por esse homem, uma espécie de “príncipe encantado” para ela, mas um tipo misterioso do qual pouco se sabe. Fora correspondida, mas ele tivera que fazer uma viagem, ficando incerta a data de seu retorno. Natália, agora, perambulava à noite pelas ruas e pelos canais da cidade, à espera do seu grande amor. Mário acaba se apaixonando por ela. Cansada de esperar, Natália, meio indecisa, julga poder amar Mário. Mas o estranho personagem acaba voltando, quando tudo parecia indicar que ela e Mário haviam se encontrado amorosamente.


Noites Brancas foi publicado como conto numa revista, pela primeira vez na Rússia, em 1848. Doistoievski é um dos maiores nomes da literatura mundial. Sua obra, como um todo, coloca para nós o problema do ser humano dividido entre as inúmeras pressões e contradições que o envolvem, temas como o da presença do mal e a busca da transcendência, a generosidade, o amor, a renúncia, a solidão, o sagrado e o sacrifício, motivos que o aproximam bastante da “alma” da velha Rússia. A cidade do conto é São Petersburgo e Mário é um sonhador, deslocado socialmente. O conto de Dostoievski se centra mais solidão dos seus personagens, gente meio inadaptada para a vida, sonhadores.

Na obra de Dostoievski, Noites Brancas, no seu todo, aproxima-se bastante, quanto aos personagens, do romance Humilhados e Ofendidos, que seria publicado em 1861, escrito para ser publicado como folhetim, em jornais. Já quanto aos personagens, Natália e Mário são, sem dúvida, parentes bem próximos do príncipe Mychkine (O Idiota). Noites Brancas nos mostra, por outro lado, o viés romântico do escritor, corrente da qual ele se aproximou, mas sem renunciar jamais às grandes linhas de sua obra.

O nome “noites brancas” refere-se a um período do ano, na região de São Petersburgo, no início do verão, entre 11 de junho e 2 de julho, em que não escurece à noite. Esse fenômeno é observado, aliás, em ambos os hemisférios da terra, em lugares situados em latitudes superiores a 60º. Estas noites em São Petersburgo, noites que “imitam” o dia, poderão concretizar os sonhos de Natália? Visconti, ambientando o filme na Itália, em Livorno e em locações internas (estúdios Cinecittà), mais exatamente, deslocará a ação do filme para o inverno, substituindo o fenômeno atmosférico russo pela neve, acentuando talvez mais o clima onírico do filme.




Um dos maiores diretores da história do cinema, Visconti (1906-1976) era descendente de uma das mais antigas famílias da nobreza italiana, a dos Visconti de Milão. A família, além de inúmeros negócios, era herdeira de uma célebre empresa química e farmacêutica, a Carlo Erba. Nos anos de juventude, ele frequentou assiduamente o mundo lírico e teatral (melodramático) italiano, um mundo que o influenciou bastante, marcando sempre a sua obra.

Na França, tornou-se amigo de Coco Chanel, ligou-se a Jean Renoir; passou depois por Hollywood, retornando a Roma. Culto, elegante, refinadíssimo, rico, homossexual assumido, ligou-se ao mundo do cinema, realizando o seu primeiro filme, Obsessão, em 1943, com Clara Calamai e Massimo Girotti. Desde então não parou mais. Em 1957, recebeu o Leão de Veneza com Noites Brancas. Fez depois Rocco e seus Irmãos (filme que consagrou Alain Delon como ator).

Ligado politicamente à esquerda italiana, era conhecido como “O Conde Vermelho”. Todos os filmes, peças teatrais e óperas que dirigiu e montou foram marcos da cultura italiana e mundial, sempre premiados em todos os maiores festivais do mundo. Durante as filmagens de Ludwig, em 1976, teve um ataque cardíaco que o prendeu à cadeira de rodas até a morte. Mesmo assim, ainda realizou duas importantes obras cinematográficas: Violência e Paixão e O Inocente. Amigo de grandes nomes do cinema, da ópera, da cultura artística. São destaques na sua filmografia: A Terra Treme, Senso, O Leopardo, Vagas Estrelas da Ursa, O Estrangeiro, Morte em Veneza, Violência e Paixão, O Inocente e outros mais. No cinema, deixou também importantes documentários, Dias De Glória, À Procura de Tadzio.


Marcello Mastroianni (1924-1996), também produtor de Noites Brancas, foi um dos maiores atores do cinema italiano. Em 1945, começou como figurante, dividindo o seu interesse pelo cinema com atividades ligadas à construção de prédios. Logo, porém, largou tudo pelo cinema. Na sua filmografia, destacamos: Divórcio à Italiana, A Doce Vida, O Belo Antônio, Os Campanheiros, Matrimônio à Italiana, Esposamante, Viagem ao Princípio do Mundo, Cinema Esplendor etc.



Maria Schell (1926-2005), austríaca de nascimento, irmã de Maximilian Schell, também ator, muito ligado a ela. Na sua filmografia, temos: Gervaise, Os Irmãos Karamazov, Cimarron, Super-Homem e outros.


Jean Marais (1913-1998) foi ator, diretor, pintor, escritor, escultor e antiquário. Seu encontro com Jean Cocteau foi decisivo, levando-o para o teatro e para o cinema. Trabalhou com grandes cineastas, Visconti, Jean Renoir, Sacha Guitry. Dentre seus filmes mais importantes, destacamos: A Bela e a Fera, O Eterno Retorno, Os Pais Terríveis, Orpheu, Élena e os Homens, A Princesa de Clèves etc.




Clara Calamai (1909-1998) foi uma das maiores atrizes do cinema italiano. Por trabalhar com diretores “especiais”, seus filmes nunca se voltaram para o “grande público”. Era uma das atrizes preferidas de Visconti. Fez poucos filmes, mas o que ficou dela será sempre importante: Obsessão, Adúltera e outros.




Visconti, em Noites Brancas, contou para apoiá-lo tecnicamente com o que de melhor havia no cinema italiano à época, um trio que, confirmando tudo o que apresentaram neste filme, nos deu ao longos dos anos grandes obras-primas.





O roteiro é também assinado por Suso Cecchi d´Amico, a música é de Nino Rota, responsabilizando-se Giuseppe Rotunno pela fotografia, todos figuras excepcionais que sempre trabalharam com grandes diretores italianos, como Fellini e Antonioni.