quinta-feira, 15 de setembro de 2011

EROS: QUESTÕES MITO-ASTROLÓGICAS

Para a cultura ocidental, tudo começou com a Mitologia grega. Eros foi, segundo Hesíodo, a primeira entidade masculina a emergir do Caos, depois que Geia e o Tártaro haviam aparecido. A seguir, surgiram o Érebo e Nix, as trevas inferiores e as trevas superiores, respectivamente. Daí para frente o universo se povoou...


Representado por um adolescente, quase uma criança ainda, eternamente jovem, Eros veio para assegurar não só a continuidade das espécies, a sua proliferação, como a própria coesão interna do cosmos. Era a pulsão fundamental do ser, aquilo que mais tarde tomaria o nome de libido, confundindo-se tanto com a energia vital e psíquica do ser humano como com o seu desejo (palavra que pode ser traduzida, segundo uma de suas etimologias, por “levantar-se da cadeira”, ou seja, ir em direção de alguma coisa, movimentar-se), cuja principal expressão é a procura instintiva do prazer sexual.
Neste sentido, Eros (arder, queimar), sobretudo enquanto se relaciona com a vida instintiva, é força que impele toda a existência e que se realiza pela ação. Esta ação só se completa pelo contato com o outro. Uma série de trocas materiais, físicas, sensíveis, mentais ou espirituais, em vários níveis, na medida em que a força erótica vai se elevando, se sublimando.
Se visto unilateralmente, Eros é uma forma de conquista. Ou seja, unilateralmente Eros é a parte que se considera o todo, o parceiro que se coloca como o todo na relação, transformando o outro num nada, destruindo-lhe a existência. Se Eros leva em consideração o outro é fonte de progresso. Se desconsidera o outro, é apropriação ou a morte do outro. No mapa astrológico, o mundo de Eros é representado pelo planeta Marte e seu elemento é o fogo. Já a noção do outro é dada pelo planeta Vênus, muito úmido e moderadamente quente.
Ainda segundo a Mitologia grega, houve um momento na história da humanidade em que se tornou necessário conter as forças eróticas, colocá-las numa perspectiva de reciprocidade. As forças eróticas soltas no cosmos estavam se tornando fonte de constante desordem, de conflitos. A sociedade se tornava mais complexa, os relacionamentos deviam se fazer de outro modo, num outro plano que não só o instintivo, animal. Um novo arquétipo, um novo padrão de comportamento, foi então criado. Referimo-nos ao aparecimento de Afrodite.
Socialmente, isto significou o estabelecimento de limites, regras, leis, de vida moral. No plano individual, a percepção do outro, dos seus valores, não mais usá-lo ou valer-se dele egoisticamente. Fazer da busca do outro um ato de entrega recíproca, generosa, um ato em que os parceiros fossem eles mesmos, mas que, cada um, na relação, fosse sempre mais. Isto significava a submissão de Eros a Afrodite ou, melhor, a integração desta irriquieta divindade à nova ordem que Afrodite representava. Algo, convenhamos, muito difícil, já que Eros, pela sua própria natureza, sempre procurou escapar de várias maneiras do controle da deusa.
Antes de nos fixarmos em Vênus e Marte será preciso entender que astrologicamente eles nos esclarecem sobre a nossa vida afetiva e sexual só se analisada a ação de ambos em conjunto com a de outros planetas, justamente aqueles que são os encarregados de estabelecer os primeiros contatos com o outro, com o “lado de lá”. Estes astros são a Lua, Mercúrio, Júpiter, Urano e Netuno.
Não se pode esquecer que Plutão deverá ser também considerado obrigatoriamente nesta fase, já que aparece como uma espécie de delineador do quadro geral onde a ação dos planetas mencionados se exercerá. Num nível mais elevado, Plutão, como regente de Escorpião, vai nos revelar o cenário da nossa sexualidade, indicando acima de tudo a maior ou menor possibilidade ou até a impossibilidade do nosso ego “morrer” ou de ser transformado no processo afetivo, levando-nos a atingir assim níveis mais ou menos profundos de consciência ou impedindo-nos de atingi-los. Num nível positivo, Plutão atuará a favor das forças regenerativas e não destrutivas, sob o ponto de vista sexual. A título de sugestão, para um melhor entendimento do que Plutão poderá significar num mapa, uma incursão às propostas do Tantrismo, acreditamos, seria muito ilustrativa. O Tantrismo, como sabemos, é um movimento filosófico e ritualístico no qual a sexualidade se destaca, movimento este que influenciou bastante seitas hinduístas, budistas e jainistas, na Índia.


TANTRISMO - KHAJURAHO

Dentre os astros que descrevem a nossa maior ou menor capacidade de estabelecer contactos, é preciso considerar antes a Lua, uma espécie de antena que sempre nos dá a primeira ideia do outro. A Lua é sempre algo que sentimos, muito mais do que explicamos. É algo que precisamos atender para nos sentirmos bem. Ela nos dá “aquela” sensação, uma “sensação” que, ao final, na maioria dos casos, é a que vai prevalecer. Isto se deve ao fato de que a Lua, dentre outras funções que pode exercer no mapa, é o astro que capta a substância etérea que se irradia, com maior ou menor intensidade, de todos os seres vivos, a que damos o nome de aura.
Vêm depois Mercúrio e Júpiter, que examinam as zonas de contato, atuando no sentido contrário da diferenciação, aproximando, procurando pontos de contacto, fazendo avaliações, interações, cada um a seu modo.
URANO
Enquanto isso, Urano e Netuno fazem as devidas ampliações, projeções, fantasias etc., em cima do que foi captado. Uma questão importante a ressaltar neste ponto é que os cinco astros acima mencionados, quanto a este assunto, obviamente funcionarão melhor se em signos mutáveis. A pior localização deles, para a questão aqui tratada, estará, primeiro, nos signos fixos e, depois, nos cardinais. São eles, num todo, que, mais ou menos favoravelmente, mobilizarão ou não a nossa vontade solar.


NASCIMENTO DE VÊNUS - BOTTICELLI
Tradicionalmente, a Astrologia ensina que Vênus na mulher é a sua libido pessoal e que Marte a representa no homem. As energias de Vênus no tema feminino e de Marte no tema masculino são dadas pela posição dos astros nos signos (dignidade, debilidade, peregrinação, trigonocracia) e pelos respectivos aspectos que os envolvem. São sempre eles, os dois astros, que vão acionar o processo afetivo e a atividade sexual, muitas vezes mesmo sem ou contra a participação solar. Sabemos também que os aspectos astrológicos entre Vênus e Marte no tema pessoal são os indicativos das possibilidades mais ou menos satisfatórias da interação afetiva e sexual. Aspectos dissonantes significam, de parte a parte, sempre relações complicadas, difíceis, senão impossíveis, às vezes tormentosas e atraentes ao mesmo tempo, sempre carregadas de muita energia.
Outra importante questão a considerar é o ‘peso” que Vênus e Marte têm em temas masculinos e femininos. Nem todo homem tem um Marte 100% masculino, nem toda mulher terá um planeta Vênus 100% feminino. A nossa maior ou menor capacidade de “receber” o outro em nós dependerá de uma imprescindível avaliação desse percentual. É neste ponto que pode entrar a questão da homossexualidade tanto masculina como feminina, que se liga sempre a uma forte presença de Aquário e de seu planeta regente Urano no mapa, este invariavelmente ligado a Vênus e a Marte. Isto não quer dizer, por outro lado, que um homem que tenha um Marte de “baixo” percentual vá optar pela via homossexual, embora a presença poderosa de um Urano possa ser considerada como um forte indício. Ou, ainda, que os astros “femininos” por excelência, Lua e Vênus, relacionados com ênfase, num tema masculino, ou que nele sejam dominantes, venham a determinar uma opção homossexual. O mesmo raciocínio poderá ser estendido a temas femininos, com as necessárias adaptações. Outras áreas dos mapas masculinos e femininos deverão merecer estudo para uma maior avaliação da questão aqui proposta, de modo especial as casas V e VIII e seus respectivos regentes.


ZEUS E GANIMEDES

A ligação entre o signo de Aquário e a homossexualidade está indicada claramente no mito grego de Ganimedes, inclusive nas estreitas ligações que este mito tem com o deus Dioniso (Hades-Plutão). Neste particular, é importante lembrar que Urano é eletromagnético (Marte é elétrico e Vênus é magnético) e que o lugar onde se encontra Urano num mapa é o lugar onde podemos não ser convencionais, onde queremos liberdade, o lugar onde podemos nos tornar imprevisíveis, extravagantes, promíscuos; o lugar onde nos recusamos a seguir a normalidade (Aquário é o exílio do Sol).

Na Mitologia grega, o tema poderá ser pesquisado nas histórias de outros personagens: a relação entre Apolo e Jacinto, entre Aquiles e Pátroclo, a história de Laio, as relações entre Ártemis e as suas ninfas e outros. O teatro de Eurípedes poderá ser, por exemplo, para o astrólogo que procure fugir da mesmice apavorante da maior parte das leituras de mapas, uma ótima fonte para o estudo das paixões.
Quanto à cultura grega, historicamente, lembremos que o tema da homossexualidade fez parte da vida de muitos personagens ilustres. Sócrates, por exemplo, já sexagenário, levantou-se para defender a pederastia como forma de educação (pedagogia), através da qual inicia o jovem e belo Alcebíades nos prazeres da carne e do espírito. Platão, a divina Safo, Aristóteles, Alexandre Magno, Aristófanes, Epaminondas e outros foram chegados a essa forma de amor, conhecido como amor grego, dórico ou socrático entre os homens e de lésbico entre as mulheres.

SÓCRATES E ALCEBÍADES
Fora do mundo grego, as pesquisas poderão ser estendidas à Bíblia, às histórias de Ovídio (Metamorfoses), à crônica dos Albigenses na Idade Média, à Literatura, à Arte e ao Cinema de um modo geral e, como não poderia deixar de ser, a Freud, para quem a homossexualidade masculina será, via de regra, o resultado da grande identificação de um menino com sua mãe, identificação esta combinada com uma forte hostilidade voltada para a figura paterna. Ou, ainda, como resultado da passagem incompleta pelas diversas fases da organização libidinal, desde a oral.
Quanto aos demais itens das possibilidades de desvios sexuais, temos a Pedofilia, ainda, ao que nos conste, não estudada suficientemente sob o ponto de vista astrológico. Segundo pudemos constatar, a motivação pedófila parece se radicar numa casa VIII “mal” resolvida, diante dos valores da IX casa. Fazem parte também dessa motivação, em temas masculinos, uma dominante lunar e os regentes das casas V e VIII. Um exemplo deste e de outros desvios encontramos na vida de Giles de Rais (1406-1440), primeiro barão da Bretanha, marechal de França, grande senhor feudal e companheiro de armas de Joana d’Arc, que raptou e sodomizou aproximadamente 140 crianças.
Já a Necrofilia, muitos exemplos podem ser encontrados na Mitologia (Antígona), na Literatura especializada (Psicologia, Sociologia, Medicina Legal), na Arte em geral, na Bíblia (Salomé-João Batista) e na crônica policial (violação de cadáveres etc.). No capítulo que chamamos de Zoofilia temos inúmeros casos na Psicopatologia Sexual. Uma boa fonte de estudos quanto a este item pode ser encontrada também na Mitologia grega (Zeus e Europa, Parsífae e o Touro de Creta).
PARSÍFAE E O TOURO DE CRETA
Nestes casos, a Astrologia poderá ser de grande valia como auxiliar para uma adequada avaliação dos fatores determinantes deste desvio que toma tecnicamente o nome de Bestialismo ou Zooerastia. Muitos casos deste item podem chegar aos consultórios (antes chegavam aos confessionários), mas a maior parte deles fica na tradição popular do homem do campo, inclusive no seu anedotário. Casos de relações de jovens com animais (galinhas, cabras, éguas etc.) poderão ser pesquisados na literatura em geral, inclusive na brasileira. Quanto ao que chamamos de Fitofilia (sexo com vegetais), palavra não dicionarizada com este sentido, entramos no mundo vegetal, bananeiras (caule e fruto), melancias, abóboras, espigas de milho, galhos e ramos de certas plantas e árvores etc fazem parte deste item como “instrumentos” ou como “parceiros” em muitos casos de iniciação ou de desvios sexuais masculinos e femininos.

POSEIDON
Urano e Netuno oferecem particular interesse a esta área das anomalias e das perversões sexuais. Ambos, cada um a seu modo, alimentam o imaginário do ser humano. Os componentes uranianos, por exemplo, costumam trazer para a sexualidade o inusitado, o diferente, além de toda uma tecnologia (infláveis, consolos, chupetas, chuchas, vibradores, bonecos, aparelhos etc). Além disso, Urano proporciona, sem dúvida, quando intervém sexualmente, ideias extravagantes, “coisas” diferentes. Urano pode se tornar muito inventivo, criativo.

GALATEA E PIGMALEÃO
O mito de Pigmalião-Galatea (fazer amor com uma estátua) é, por exemplo, um caso de natureza aquariana, onde os dois regentes do signo entram. Não esqueçamos mais uma vez que o Sol, símbolo do ego racional, está exilado no signo de Aquário.
Já Netuno (exaltado em Leão), cujo principal efeito, o solvente, deverá ser observado sempre, poderá entrar nestes itens como um desejo de refinamento, de adesão a valores cósmicos, de busca de valores espirituais mais altos, de experiências masoquistas, religiosas etc. Podemos ainda, se for o caso, observar a possível utilização de drogas uranianas (aceleram, ativam) e as netunianas (relaxam, abrem, aumentam a receptividade) através das relações astrológicas de temas estudados. A história do nascimento de Teseu é um dos melhores exemplos de sexo realizado com a intervenção netuniana: Etra teve um sonho no qual Palas Athena lhe apareceu, ordenando-lhe que fosse a uma determinada ilha; ainda sonhando, ela foi e lá lhe surgiu o deus Poseidon, que a fecundou. Dessa relação, nasceu o grande herói Teseu, que Egeu, marido de Etra, sempre julgou ser filho.
Marte e Plutão (este muito ligado a sequestros, responsável por verdadeiras “temporadas infernais” pelas quais podemos passar, inclusive sexualmente) fazem parte dos casos onde o sadismo e o masoquismo se apresentam. O primeiro é uma forma de manifestação da pulsão sexual que visa causar sofrimento no ato sexual ao parceiro, uma dor física, ou, pelo menos, dominação, humilhação, subjugação. Já o masoquismo é a procura da dor física ou do sofrimento e da desgraça no sexo, procura que pode ser inclusive inconsciente, principalmente no caso do masoquismo de ordem moral. No masoquismo o prazer é ligado à dor. O jogo sexual aqui é confuso, já que há casos em que o masoquista, ao se colocar como objeto, procura quase que invariavelmente provocar a culpa no outro.
Não é por acaso que Marte (sua posição e seus aspectos) deve ser, quanto a este último parágrafo, o centro de nossas atenções. Marte tem relação com muitas ações violentas, destacando-se, dentre elas, neste particular, as expressas pelos verbos destruir, odiar, agredir, rasgar, violentar, competir etc. Unhadas, mordidas e escarificações são de Marte no amor. Se as mãos forem priorizadas no relacionamento sexual, sempre será interessante examinar Mercúrio. Se a boca, Vênus e assim por diante. Os casos de sadomasoquismo costumam aparecer através de aspectos envolvendo Marte, Saturno e Plutão de um lado e, de outro, Lua e Vênus, sobretudo. Quanto a Plutão, lembremos que ele sugere um desejo de penetração no oculto (Plutão governa orifícios, buracos, cavernas etc, lugares que dão acesso ao Hades), no “outro lado”, podendo este desejo ser tanto visto como autodestruição ou como renascimento, sendo o ato sexual uma via para ambos.

O RAPTO DE KORE POR PLUTÃO
Particularmente interessante, por exemplo, é a fixação sexual de certas pessoas na chamada fase oral (Vênus). Esta fase se caracteriza, como Freud lembra, por uma organização sexual canibal. A atividade sexual neste caso se liga a um desejo de incorporação do outro, um desejo de “devorá-lo”: Misturam-se aqui duas atividades: a sexual e a alimentar. A zona buco-labial transforma-se em zona erógena privilegiada. Uma variante desta atividade, de caráter violento, agressivo, é a mordida no ato sexual, caracterizando-se então a pulsão sexual destruidora.