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FICUS BENGHALENSIS |
A oliveira, a vinha e a
figueira são as três mais importantes expressões do mundo vegetal nas antigas
sociedades mediterrâneas. As três estão ligadas ao cotidiano dessas sociedades,
fazendo parte da sua economia, da sua alimentação, dos seus costumes, da sua
medicina popular, dos seus mitos e lendas, das suas crenças religiosas.
Há uma vasta literatura
sobre as duas primeiras, ligadas de modo especial ao mundo greco-romano, sobejamente
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BÉRBERE - MARROCOS |
conhecida. Já quanto à figueira, embora também faça ela parte da cultura ocidental, pelos
motivos acima expostos, pouco se sabe dela, como árvore-símbolo dos povos do norte da
África. O que vai nos interessar mais neste trabalho é o levantamento de
algumas questões que, longe de esgotar o assunto, possam nos ajudar a entender
como essa árvore se tornou tão importante para muitas civilizações do mundo
antigo, especialmente sob o ponto de vista religioso.
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ÁFRICA COM O NORTE EM DESTAQUE |
As figueiras são conhecidas
também como ficus, calculando os
botânicos que no mundo todo haja cerca de oitocentas espécies dessa árvore,
especialmente em regiões de clima tropical e subtropical. Os frutos da figueira,
além de muito consumidos pelos seres humanos, fornecem alimento para aves,
símios e peixes (frutos caídos na água). O fruto da figueira mais consumido em
todo o mundo é o proveniente da Ficus
Carica, assim designada porque se supõe que seja a Cária a região de sua
origem. A Cária (etimologicamente, país montanhoso) estava situada no noroeste
da Ásia Menor. Colônia fenícia, foi helenizada pelos dóricos e depois tomada
pelos persas, passando depois para o poder romano no início de nossa era.
Conhecida desde o período
neolítico, a figueira sempre foi considerada como a árvore da generosidade e da
abundância em virtude de suas virtudes protetoras, fecundantes e regeneradoras.
Um dos primeiros povos a nos
revelar os segredos da figueira foi o egípcio,
interessado inclusive por técnicas de seu cultivo (arboricultura),
principalmente sob o ponto de vista frutífero e do aproveitamento do seu lenho,
há muito usado para a construção de
sarcófagos. Conheciam os egípcios um processo chamado caprificatio através do qual as frutas fêmeas eram polinizadas por
um inseto, o blastófago, que abriam nos frutos um orifício para esse fim. Os
gregos e romanos também conheceram esse processo, descrito, por Teofrasto,
discípulo de Platão, e pelo naturalista
romano Plínio, O Velho.
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CLEÓPATRA |
Um dos grandes
acontecimentos da vida do povo egípcio, aliás, tem relação com os figos, muito
apreciados por Cleópatra, a última rainha do país, da dinastia dos Ptolomeus. Consta
da sua biografia um episódio, não confirmado historicamente, o de que a
serpente (víbora) que lhe picou mortalmente o seio veio escondida num grande
cesto de figos por ela pedido à sua criadagem. Uma das espécies mais conhecidas
da árvore tem entre os egípcios o nome de figueira dos faraós.
A figueira dos faraós (ficus sycomorus) tem também o nome de
sicômoro é árvore muito comum em todo o norte da África, cultivada tanto pelos
seus frutos comestíveis e também como planta melífera e ornamental pelas suas
flores, sendo inclusive muito útil na tinturaria (tingimento de tecidos). Sua
madeira, além de bastante usada para a construção de sarcófagos, como se disse,
é especialmente empregada na confecção
de instrumentos musicais e de móveis.
A origem do sicômoro é
explicada pelos gregos por um mito. Os gigantes eram os inimigos naturais dos
deuses. Reia,
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REIA |
esposa de Kronos, mãe dos futuros olímpicos, ao ser ameaçada por
um deles, de nome Syceu, o transformou numa árvore, o sicômoro, nome que, em
grego, se decompõe: sycon, figo, e moron, vermelho escuro, também amora.
Segundo uma outra versão, Syceu foi um dos titãs que salvou Geia, sua mãe,
então perseguida por Zeus, quando da titanomaquia (luta entre os titãs e os
futuros olímpicos). Siceu fez nascer uma gigantesca figueira para que Geia nela
pudesse se esconder.
Gaius Julius Solinus,
gramático e escritor latino (séc. III dC), nos seus deliciosos textos Collectanea Rerum Memorabilium
e Polyhistor, nos informa que a figueira é
a principal árvore do Egito. Sua folha, prossegue, é muito parecida com a da
amoreira; seus frutos são encontrados tanto nos galhos como no tronco; a árvore
nos dá seus frutos sete vezes por ano (sic); mal colhido um, outro começa a
despontar no lugar do que foi colhido. A sua madeira, lançada à água, desce ao
fundo; depois de um certo tempo, ela volta à superfície. Esta imagem da madeira
boiando à superfície das águas foi
usada na arte mortuária (sarcófagos) para
representar a dispersão dos membros do deus Osíris nas águas do rio Nilo. Por
sua fecundidade excepcional, a árvore era conhecida como a nutriz por
excelência dos defuntos na sua viagem para o Amenti (O Outro Lado). Por essa
razão, plantavam-na diante dos túmulos para assegurar a proteção ao defunto até
a sua apresentação diante de Osíris.
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OSIRIS |
Muito procurada pelos
amantes, que gostavam de se refugiar à sua sombra, a figueira tem lugar de
destaque na poesia amorosa, desde o período pré-dinástico. Os poetas nos
informam que, quando ela “fala” (o movimento de sua ramagem), suas palavras são
como gotas de mel; sua textura é a da faiança, sendo sua sombra fresca sempre
proteção.
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NUT E GEB - CÉU E TERRA |
Nos Textos das Pirâmides
encontramos referências que ligam a figueira à deusa Nut. Como divindade
celeste, é ela
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RA |
que dá nascimento aos astros, que engole a cada entardecer e os devolve pela
manhã. Assim, o lenho da figueira como sarcófago engole o defunto para
transformá-lo num novo Osíris. Nos capítulos 109 e 149 do Livro dos Mortos
encontramos referências a ela; no primeiro, há uma menção aos espíritos que
habitam nas copas dos sicômoros de esmeralda, ornamento dos rios, que deslizam
silenciosos. No segundo, se registra que, na sua viagem, Ra (Sol), com a sua
barca, passa por dois sicômoros cor de turquesa.
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ÍSIS |
Árvore de Ísis, sabe-se que egípcios, além
do uso do figo para a fabricação de produtos farmacêuticos, faziam para
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FIGOS SECOS |
suas
cerimônias religiosas uma bebida com eles. Informações dos tempos da dinastia
dos Ramsés nos dão a conhecer que enfiadas de figos secos eram servidas em repastos
depois de longas viagens. Os figos eram usados também para a engorda de gansos
com fim de se preparar o
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FOIE GRAS |
foie gras
(fígado de ganso gordo) e na arte da panificação. Esta técnica, séculos e
séculos mais tarde, muito difundida entre a elite romana, seria passada para os
franceses. Luís XIV estimulou grandemente a plantação de figos na região de
Versalhes, dos tipos Rouge d´Argenteuil e Dauphine.
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POMAR REAL DE VERSALHES |
Para uso religioso, os
egípcios importaram de uma região do Mar Vermelho, do misterioso País do Punt,
sinônimo de paraíso terrestre para eles, sicômoros especiais (nehat) para
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FIGUEIRA DE PUNT |
a produção de incenso. Estas
árvores foram plantadas nos terraços do templo funerário da rainha Hatshepsut,
filha de Tutmosis I, “aquela que reinou como um homem”. As figueiras eram
particularmente usadas para cercar os templos, formando em torno deles um
cinturão de frescor bastante agradável. As Casas de Vida, centros culturais
construídos ao lado dos templos, eram também cercadas por figueiras com esse
fim. As deusas Hathor e Isis tinham especial predileção pelos sicômoros para as
suas manifestações.
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TEMPLO FUNERÁRIO DE HATSHEPSUT |
Para alguns estudiosos, o
nome grego sykon (figo) teria vindo
da Fenícia, lá usado para designar o fruto da Ficus Carica, muito consumido. Conhecido há mais de 10.000 anos,
sua cultura já estava estabelecida por volta de 5.000 aC no Oriente Médio,
espalhando-a os fenícios por todo o Mediterrâneo e propagando-a posteriormente
os cartagineses, gregos e romanos. Recentemente, lembremos, arqueólogos
israelenses descobriram que o figo já era cultivado na Cisjordânia desde o
período neolítico e atestada a sua importância como alimento privilegiado,
especialmente quando seco, para ser comido em épocas de escassez alimentar ou
no inverno.
Na Grécia antiga, o figo,
sempre considerado como um importante alimento (sua exportação era proibida),
tinha um status privilegiado (dádiva divina). Aqueles que os contrabandeavam ou
roubavam eram conhecidos pelo nome de sicofantas. O nome, inicialmente, foi
aplicado aos encarregados de vigiar os frutos; depois, passou a ser usado para
designar esse funcionário como
caluniador, porque,
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DIONISO |
aproveitando-se do cargo, ele fazia denúncias sem
fundamento, só por perseguição ou antipatia. Muito apreciado pelos gregos, o
figo fazia normalmente parte de sua alimentação diária. Essa importância está
inclusive registrada no mito, onde encontramos a história de Syke (o figo), ninfa pela qual o deus
Dioniso se apaixonou. Como símbolo da fertilidade, o fruto era muito usado como
um dos alimentos consumidos na primeira fase dos Mistérios de Eleusis, a orgia, juntamente com o kykeon, bebida à base de vinho, de
caráter enteógeno, que tinha entre os seus componentes certos fungos (mais
tarde, usados como base do LSD), conhecidos como alimento dos deuses (broma theon), que produziam visões fantásticas.
Em algumas passagens
míticas, temos informações de que o figo era uma dádiva de Deméter, considerada
“tão ou mais importante que o ouro”. Citado na Ilíada e na Odisseia, diariamente
consumido, ele era especialmente recomendado aos atletas olímpicos quando
concentrados para os agones, já que
dava “força e agilidade”. Na medicina, como uma espécie de panaceia, eram
famosos os cataplasmas de figo. Platão acreditava na sua origem divina (dádiva de Deméter) e, como todo grego, era
um philosykos, amigo dos figos. Na
sua Academia, sugeria que para melhor
filosofar os seus discípulos comessem muitos figos. Para a saúde do corpo eram
também recomendados os frutos; em
Esparta, faziam parte, desde cedo, da alimentação da crianças entregues à
tutela do Estado.
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ACADEMIA DE PLATÃO |
Entre os romanos, a figueira
aparece no mito de Rômulo e Remo, encontrados ao pé de uma delas, ali sendo alimentados por uma loba. Inspirado pelos deuses, o pastor
Fáustulo os encontrou e os entregou a sua esposa, Aca Larência, para que ela os
criasse. À figueira foi dado o nome latino faustulus,
tornando-se ela um símbolo político de
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RÔMULO E REMO |
proteção. Quem nos conta esta história é
Plínio, o Velho: o local onde os gêmeos foram encontrados recebeu o nome de
Lupercal; no cume do Palatino, berço de Roma, havia uma gruta sagrada onde a
loba Luperca amamentou os meninos. O local era conhecido por uma enorme
figueira, de nome Ruminal, ao lado da qual borbulhava uma fonte. Rumis era um nome carinhoso dado às
mães e popularmente ao seio feminino. Plínio nos informa também que a figueira
Ruminal tinha a fama de proteger contra a ação dos raios.
Os romanos costumavam
consumir os figos à mesa, frescos ou como foie
gras, e, fora dela, secos. Catão recomendava que, nessa condição, antes de colocá-los em
cestos, era
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CATÃO |
preciso muito cuidado para que não contivessem nenhuma umidade,
livrando-os assim do bolor. Depois de secos, segundo ele, os figos se
transformavam num excelente alimento para os humanos e para os animais,
servindo de base para muitos produtos medicinais. Plínio falava que o figo era
um bom substituto do pão, podendo entrar na ração dos escravos com essa
finalidade. A história registrou que Marcus Gavius Agicius, gastrônomo, séc. I
dC, introduziu em Roma a técnica de engorda do fígado dos gansos. Chama-se ficatum o fígado da ave assim engordado.
Catão, o Censor, usou a
figueira, por sua resistência e facilidade de propagação, como um símbolo
(metáfora) para advertir os romanos do perigo que representava a África, ou
melhor, Cartago. Como a figueira, uma “verdadeira praga africana”, a cidade de
Cartago resistia bravamente a Roma, afrontando o seu poder. Daí a divisa de
Catão: Delenda Carthago, com a qual
encerrava todos os seus discursos diante do perigo que oferecia a cidade
púnica. Na origem, punicans, tis, queria
dizer vermelho, púrpura. Dela saiu punicus
para designar as coisas cartaginesas; por exemplo, punica fides, a má fé, a fé púnica (mercantilismo); punica ars, estratagemas usados pelos
cartagineses para enganar, tudo isto, evidentemente, sob o ponto de vista dos
romanos.
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MOISÉS (MICHELANGELO) |
O figo foi um dos tesouros
que Moisés prometeu aos judeus quando chegassem à Terra Prometida. A Bíblia nos
diz que Adão e Eva esconderam a sua nudez com folhas da figueira depois de
terem desobedecido a ordem recebida de não comer os frutos da árvore da
sabedoria. Entre os cristãos, a figueira aparece nos evangelhos de Marcos
(11:12-14 e 11:20-25)) e Mateus (21:18-22). É conhecida por muitos católicos a
Parábola da Figueira Estéril. Segundo muitos estudiosos, Cristo teria usado a
figueira como uma metáfora a fim de descrever a aparência externa da nação
judaica como algo grandioso (a sua copa, a sua ramagem), mas que deixara há
muito de produzir alguma coisa útil para a glória de Deus.
Assim a figueira, na
tradição cristã, tornou-se a árvore do mal, simbolizando tanto a sinagoga, que
não reconheceu o Cristo, como todas as doutrinas heréticas. A tradição medieval
cristã aproximava o verbo peccare (pecar) da palavra hebraica pag, figo.
Considerada árvore da abundância, da fecundidade perigosa e descontrolada, a
figueira aparece na Bíblia como a árvore da ciência, sempre perigosa para as
questões da fé. Árvore na qual Judas Escariotes se enforcou, sempre maldita, associada
a ritos de fecundação, sempre
fez parte do universo simbólico das divindades fálicas, Dioniso, Príapo e
outras, satanizada por isso pelos cristãos.
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EXPULSÃO DO PARAÍSO (MICHELANGELO) |
Ao comer os frutos
proibidos, Adão e Eva abandonaram o divino. Tentados, pressionados por forças
inconscientes que não dominavam (a serpente), acharam, ao comer figos, que
podiam adquirir o conhecimento que os igualasse a Deus. Ora, o divino é um
mundo ao qual só se pode ter acesso pela fé, nunca pela razão. A figueira, por
causa dessa carga de maldição no mundo cristão, foi condenada a dar frutos sem
florir.
A Árvore do Conhecimento,
conhecida como a Árvore do
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FÊNIX |
Bem e do Mal, a grande figueira, estava no Jardim do Éden. Não
só Adão e Eva, instigados pela Serpente, comeram os seus frutos; todos os
animais da criação comeram-nos também. Só uma ave se absteve, sendo
transformada por isso na Fênix, a ave que nunca morre.
A Árvore do Conhecimento é, como se pode
constatar, uma metáfora que admite leituras em várias direções: a) como símbolo
da capacidade de discernimento que o homem devia demonstrar diante do Bem e do
Mal; b) como uma representação da vida sexual não ligada à procriação, mas tão
só ao prazer; c) como uma representação do psiquismo humano; Adão, o
consciente, masculino; Eva o inconsciente, feminino. Daí, a relação entre a
mulher e a serpente e a culpa atribuída a esta (s) última (s) pela perda do
Paraíso; aliás, foi por esta razão que a serpente, nos meios judaico-cristãos,
passou a simbolizar o Mal; a sua peçonha foi inoculada, segundo os judeus, em todos os descendentes de Eva, tendo sido, porém, removida do povo de Israel quando a Torá lhe foi transmitida; foi por esta razão também que se atribuiu a paternidade de Caim à serpente e não a Adão; d) uma Ilustração da vida humana que rejeita
os valores do mundo natural ao optar pelo luxo, pela concupiscência, pela
corrupção da riqueza.
É do mundo grego que nos vem
a sycomanteia (sicomancia) uma forma
de adivinhação praticada com as folhas da figueira. Escreve-se um nome numa
folha, nome sobre o qual se deseja alguma informação. Se a folha secar rapidamente,
o sinal é de mau augúrio. Se custar a secar, o sinal é de bom augúrio.
Ciência, fígado e fogo se
equivalem no contexto semântico
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PROMETEU |
do mito grego de Prometeu, o titã que roubou o
fogo dos céus (do deus Hélio), trazendo-o escondido no galho oco de uma
figueira, e o entregou aos humanos. Por isso, como punição, teve o seu
fígado destruído e recomposto alternadamente por um abutre gigantesco.
Destruído durante o dia, o fígado se recompunha à noite quando a pavorosa ave
se afastava. A palavra latina ficatum,
como vimos, também designa o fígado de ave engordada com figos.
O nome
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SIGNO DE GÊMEOS |
Prometeu, por outro lado, etimologicamente o que sabe antes, o previdente, vem
de um verbo, manthanein, que tem
relação com a produção do fogo pelo atrito de dois pequenos bastões, símbolo,
na Astrologia, do signo de Gêmeos, do elemento ar, ligado à vida mental.
Na língua sânscrita, o
substantivo manthini designa o ato de
se girar bastões para a produção
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AGNI |
do fogo, da manteiga etc. Já se levantou a
hipótese de que Prometeu seria o modelo grego dos sacerdotes que no mundo
indo-europeu cultuavam o fogo. Na Índia, esses sacerdotes participavam do culto
de Agni, uma das três grandes divindades do fogo no mundo védico (Surya e Indra
são as outras).
Simbolicamente, o fígado, em
muitas tradições, sempre apareceu associado ao fogo como sede de paixões com o
sentido de morte da alma, como privação de Deus. Esta privação toma aqui também
(e em muitas outras tradições) o sentido de excesso, de orgulho mental, que neste
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SÃO JOÃO DA CRUZ |
sentido, por exemplo, encontramos tanto em São João da Cruz como no mito
de Prometeu. Ao receber o fogo de Prometeu, os humanos, ao utilizá-lo somente
para a vida mental, para a ciência e para seu subproduto, a tecnologia, para a enorme produção de bens materiais, perderam a sua dimensão espiritual.
O presente de Prometeu, o chamado filantropíssimo, se constituíu nesse sentido
numa dádiva e numa maldição. Prometeu, para os humanos, um grande benfeitor, sob
o ponto de vista divino, um ser perigoso, um ladrão. A rigor, o titã foi um
agente duplo, como expusemos no trabalho “Prometeu, Platão e a Mitologia”,
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GASTON BACHELARD |
neste blog.
Acho oportuno lembrar a esta altura que foi o mestre Gaston
Bachelard quem fixou melhor para nós a ambígua figura do Filantropíssimo, ao
formular o chamado complexo de Prometeu: tendência que tem o ser humano de saber
mais do que aqueles que o antecederam, pais, professores, mestres. Esse
complexo, como diz Bachelard, ilustra a vontade humana com relação à vida
intelectual, tornando-a dependente exclusivamente do princípio da utilidade
material Ou seja: o complexo representa a atitude moral que considera como
superior tudo o que, sob o ponto de vista utilitário, nos dá mais felicidade. Uma
espécie de “aritmética dos prazeres” que tem a finalidade de aumentar cada vez
mais o bem-estar material da humanidade.
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HÉRCULES SALVA PROMETEU |
Punido pelos deuses,
Prometeu foi aprisionado nas montanhas do Cáucaso. Ali ficou por muito, tendo o
seu fígado destruído e recomposto diariamente, até que Hércules, quando do
terceiro trabalho (também neste blog), o libertou. Para um melhor entendimento
e uma confirmação do que aqui se expõe, útil a contribuição astrológica.
O fígado, astrologicamente,
tem a ver com o planeta Júpiter, regente do signo de Sagitário. Esse planeta
representa os princípios superiores que devem orientar o homem, tanto
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FÍGADO |
espiritual, como mental e fisicamente. Bem trabalhado, o planeta é generoso,
protetor, otimista, sustentador. No corpo humano tem muito a ver com as propriedades nutritivas
e protetoras do sangue. Rege, dentre outras parte e órgãos, o fígado, o baço, a
vesícula biliar, a transformação dos açúcares, a atividade química do corpo.
Doenças jupiterianas produzem desordens sanguíneas, problemas no fígado, hemorragias,
hiperglicemia. Tanto como órgão gerador da
vida, de virtudes guerreiras e de coragem, o fígado é, por outro lado, o lugar
onde o ser humano deposita sentimentos como a cólera, a dor, o ódio.
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GULA (HIERONYMUS BOSCH) |
Palavras
como melancolia (melanos, negro, khole, bílis) atrabiliário (atra, negro, sombrio, mais bilis) e figadal são desse universo. Figadal é o que atinge profundamente; um inimigo figadal nos provoca rancor, faz mal às nossas víceras.
Júpiter aponta para descontroles alimentares, moléstias
pulmonares (ação reflexa), impurezas do sangue, adiposidade, obesidade,
flatulência etc. Muitos dos problemas de saúde causados por Júpiter estão ligados
aos órgãos da nutrição, do metabolismo, da assimilação, da combustão e das
reservas. O fígado, nesses casos, deve ser o primeiro a se observar: é o lugar,
como se disse, onde depositamos os excessos. A gulodice é um dos pecados
capitais dos sagitarianos; abundância alimentar, degustações de pratos ricos,
tudo contribuindo para que o fígado receba grandes quantidades de gordura. Não
metabolizada, esta gordura vai engrossar a silhueta, produzindo marcas
características nos do signo que se descontrolam, ganho de peso, produzindo a
chamada obesidade visceral (esteatose, degenerescência gordurosa de um tecido).
Um dos males mais comuns em sagitarianos que vivem desse modo é, por isso, a
diabetes. No mais, persistindo o desequilíbrio, a bulimia, acessos de
hiperfagia etc. Uma das consequências mais notáveis dos excessos sagitarianos é
a gota, moléstia provocada por excesso de ácido úrico no organismo, causador de
dolorosas inflamações nas articulações. É uma moléstia que vem acompanha
geralmente de obesidade, pressão arterial elevada e níveis altos de colesterol
(khole, bilis, stereos, sólido).
Aplicando o princípio da
correspondência (Hermetismo) ao que acima se expôs, fica fácil entender porque Sagitário
e Júpiter têm a ver com o distante, com as religiões, com as heresias, com a
filosofia. Num nível superior, Júpiter, espiritualmente, representa a revelação
e a comunicação, a expansão pela qual a
vida instintiva e a vida mental podem buscar um “além-eu” através de vários
modelos de transcendência.
O fogo que Prometeu entregou
aos humanos perdeu o sentido da transcendência; veio criando, ao longos dos
milênios, ao invés de modelos superiores da inquietação humana, formas doentias de vida, hoje integradas ao
quotidiano (material) das pessoa como busca desenfreada da riqueza, consumismo, nomadismo, esportes radicais, agitação sob o
nome de aventuras, desejo de viajar por
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BOLSA DE VALORES |
nada, degustação de paisagens pitorescas, especulações
ruinosas (jogo do dinheiro) sob o ponto de vista econômico, negócios
internacionais questionáveis, competições esportivas motivadas pelo lucro, corrupção do espírito olímpico etc. Ao lado de
tudo isto, os vícios de sempre, cada vez mais evidentes porque proclamados e
divulgados hoje pelas diversas webs:
a ignorância pretensiosa, o exagero, a irreflexão, a imoderação, o despudor, a autoindulgência, a falta de sinceridade, a indigência mental, o exibicionismo, o orgulho arrogante e
inútil, a fanfarronice. Isto significa nenhum impulso real para se dar à vida um sentido
espiritual, nenhuma vontade de se impregnar as questões práticas com alguma
forma de idealismo nem de se procurar entender que as formas mais elevadas de
transcendência estão nas viagens que podemos fazer para dentro de nós mesmos.
No mundo islâmico, os
camponeses consideravam o figo como um fruto sagrado, bendito (baraka). Sua
antiguidade está longamente atestada, fazendo, por exemplo, parte do cerimonial
das núpcias entre os bérberes (grupo étnico nômade de origem camita que habita
o norte da África desde a pré-história) e camponeses, de um modo geral. A 95ª
surata (subdivisão do Corão) começa por uma evocação da figueira e da oliveira.
O simbolismo da fecundidade da figueira é, contudo, pré-islâmico. É por essa
razão que na África do norte a figueira é sinônimo de testículos.
Entre os povos do norte da
África, o figo seco é conhecido pelo nome araula,
considerado sempre como um alimento
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CARAVANA |
muito importante, imprescindível para os
pastores do deserto, para os trabalhadores braçais ou para qualquer pessoa que
trabalhe fora de casa. São usados também os figos na composição da Fakia, (mistura de frutos secos, nozes,
passas etc.), consumida nas festas de
Ennair (ano novo agrário), e como
acompanhamento nos ritos de inumação. O figo entra ainda como elemento básico
para a produção de uma bebida alcoólica, a Mahya,
uma espécie de aguardente.
É na Índia que encontramos o
maior exemplar da figueira, a Ficus
Bhengalensis, seculare, cuja copa chega a atingir mais
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FICUS RELIGIOSA |
de trezentos metros
de diâmetro. Dentre as várias espécies da árvore, a mais importante é, sem
dúvida, a Ficus Religiosa. Ashvata (Ashavattha, em sânscrito), conhecida
desde os tempos prévédicos. Já era usada como símbolo religioso em Mohenjo
Daro e Harappa (entre 5.000 e 3.000 aC), cidades do vale do rio Indus, em
ruínas quando as tribos árias chegaram à região por volta de 2000 aC.
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ASWINS |
Duas etimologias podem ser
estabelecidas para a palavra: 1) tha,
em sânscrito quer dizer permanecer, ficar; ashva
é cavalo. Liga-se o nome ao signo de Mithuna (Gêmeos), na astrologia védica (Jyotish). Os Gêmeos têm o nome de Ashwins (Dióscuros, na mitologia grega); são divindades que fazem
nos céus a transição das trevas noturnas para a luz, antecedendo o Sol (Surya), simbolizando como tal o
princípio da vida consciente, que deve caminhar espiritualmente em direção do Brahman (O Todo). Com os Ashwins vem Ushas, a deusa da Aurora (Eos
na mitologia grega). Os Ashwins são
deuses cavaleiros e exercem várias funções, de modo especial a médica. São divindades
curadoras na medida em que controlam os cavalos. O cavalo, como se sabe, em
todas as tradições, é um dos grandes símbolos do psiquismo inconsciente; 2) a é partícula que indica em sânscrito
negatividade; shwa, quer dizer
amanhã; tha, quer dizer permanecer,
ficar, como está acima. A palavra significaria pois “aquilo que nunca permanece
o mesmo de um dia para o outro”, isto é, o transitório. Nas escolas filosóficas
(darshanas) do Hinduísmo, ashvattha é o mundo fenomênico, aquilo
que dura muito pouco, o mundo de Maya,
mutável e perecível, “o que não permanece o mesmo de hoje para a amanhã.”
Posteriormente, na tradição
Hinduísta, principalmente nos Upanishads e no poema Bhagavad Gita, ashvattha tornou-se a árvore invertida que se identifica com o eixo
do mundo (axis mundi), que une o céu,
onde estão as suas raízes, à terra, por onde se espalha a sua ramagem (as
escrituras sagradas, os Vedas). No Budismo a árvore tem o nome de pippal. A iluminação do príncipe
Sidharta Gautama, que o transformou em Buda, ocorreu numa Lua cheia do mês de
maio; sentado sob a figueira, em Boddhi Gaya, perto do Nepal, o príncipe kshatrya “aquietou os seus cavalos”.
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ILUMINAÇÃO DE BUDA |
“Aquietar os cavalos” quer dizer aqui dominar o turbilhão mental e
emocional interior, representado astrologicamente por Lua (emocional) e por
Mercúrio (mente comum). Estes dois astros são os que mais velozmente circulam
nos céus. A Lua, ligada à água, governa o emocional, de natureza inconsciente,
enquanto Mercúrio, ligado ao elemento ar, simboliza o mental comum, sempre
dispersivo, impregnado de interferências lunares. É por esta razão que o
Budismo é um Yoga (da raíz sânscrita yuj, atrelar, jungir), instrumento de
controle dos “cavalos”, símbolos do psiquismo inconsciente.
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TRIMURTI |
Em muitos lugares da Índia,
a grande figueira é conhecida também como banian
(Ficus Indica ou Ficus Benghalensis), símbolo da imortalidade, do conhecimento
superior. Confunde-se ela com Vishnu, segunda pessoa da trimurti hinduísta, que
tem tantos nomes quantos galhos tem a figueira sagrada. Os vishnuístas adoram esta
árvore, muito encontrada na vizinhança de seus templos. Em cada cidade do
interior da Índia, há um banian
sagrado; seus galhos pendentes em direção da terra dão nascimento a novos
troncos e é no seu cruzamento que os templos e lugares sagrados de repouso são
construídos.