terça-feira, 4 de julho de 2017

TRONO MANCHADO DE SANGUE


TRONO  MANCHADO  DE  SANGUE
Trono Manchado de Sangue é um filme de 1957, dirigido por Akira Kurosawa (1910-1998), um dos maiores cineastas da história do cinema. Sua carreira se estendeu por cinquenta anos e sua obra influenciou outros cineastas de vários países, principalmente norte-americanos. Financeiramente, a família, isto é, o pai sempre procurou proporcionar uma educação mais refinada para os seus filhos, de modo especial para Akira que, desde cedo, manifestou muito interesse pela cultura ocidental. 

Akira Kurosawa tentou inicialmente a pintura, frequentando centros de arte. O conhecimento adquirido nestes centros o ajudou bastante mais tarde, quando no cinema, e já ensaiando os seus primeiros passos na direção, desenhava os seus filmes como storybords. Outra paixão sua foi a literatura, de onde tirou a inspiração para a maior parte de seus filmes.


AKIRA   KUROSAWA

Foi o irmão mais velho, que trabalhava como benshi (narrador de filmes do cinema mudo) que o iniciou no cinema. Heigo, assim se chamava o irmão, quando o cinema mudo foi substituído pelo sonoro, se decepcionou tanto que, vitimado por profunda depressão, acabou se suicidando. Só em 1936, ao ler num jornal que um estúdio de cinema estava recrutando assistentes de direção, Akira voltou a se interessar pela arte cinematográfico. Entre 1943 e 1965 dirigiu 24 filmes, sendo o primeiro, de muito sucesso, Sugata Sanchiro, a história de um lutador. Seu último filme, Depois da Chuva, foi terminado depois de sua morte.


RAN
No cinema japonês, Kurosawa foi o introdutor do gênero chambara (samurai), no qual sempre procurou destacar temas como honra, lealdade ao clã e fidelidade à palavra dada. Em 1971, Kurosawa passou por um período difícil, vitimado por profunda depressão, chegando a tentar o suicídio algumas vezes. Ajudaram-no a superar essa difícil fase, inclusive obtendo financiamentos para ele, alguns jovens diretores norte-americanos, entusiastas de sua obra, como George Lucas e Francis Ford Coppola. Em 1985, Kurosawa recebeu homenagens em Cannes por seu filme Ran, que considerava o filme de sua vida, baseado em William Shakespeare (Rei Lear).

RYONUSUKE   AKUTAGAWA 
O reconhecimento internacional do cinema de Kurosawa se deu em 1950 quando, a pedido de um estúdio, se decidiu filmar uma história (Dentro de Um Bosque) do escritor Ryunosuke Akutagawa, que narrava o assassinato de um samurai e o estupro de sua esposa. O filme tomou o título de Rashomon, com o grande ator Toshiro Mifune, no papel principal, um dos mais importantes filmes da cinematografia mundial em todos os tempos, tendo recebido Leão de Ouro no Festival de Veneza em 1951. 

Depois de ter realizado filmes excepcionais, O Idiota (baseado em Dostoievski) e Os Sete Samurais, este obra-prima absoluta, além de outros, que abriram inclusive o mercado internacional para filmes  japoneses de grandes diretores, Kurosawa se lançou à realização de Trono Manchado de Sangue, cujo argumento foi retirado de uma tragédia shakespeareana, Macbeth. Kurosawa deu ao filme um tratamento bem “oriental”, fazendo os atores, de modo especial a atriz Isuzu Yamada, seguirem as técnicas de representação do teatro Noh.


OS  SETE   SAMURAIS


A   BRUXA
A história é transposta para o séc. XVI, no período Sengoku, quando as guerras civis assolavam o país. Dois valentes guerreiros, Taketori e Miki, regressam aos seus domínios depois de uma vitoriosa batalha. No caminho, uma misteriosa mulher, uma bruxa, fala sobre o futuro de um deles, que se converterá em senhor do Castelo do Norte (O Castelo da Teia de Aranha é o título do filme em japonês). A partir dessa revelação, Taketori, auxiliado por sua mulher, Asaji, se envolve numa trágica e sangrenta luta pelo poder.

Na filmografia de Kurosawa, destacamos: Anjo Embriagado, Rashomon (As Portas do Inferno), O Idiota, Viver, Os Sete Samurais, Ralé, O Caminho da Vida (Dodeskaden), A Sombra de Um samurai (Kagemusha), Dersu Uzala, Ran, Sonhos, Madadayo e outros.

Macbeth é um das mais importantes peças de William Shakespeare, escrita entre 1603 e 1606. É uma história sobre as paixões humanas, sobre a cobiça, o poder e a inveja. Por ela tomamos conhecimento de um regicídio: um comandante militar, Macbeth, instigado por sua mulher, mata o rei e assume o seu lugar. Os criminosos, porém, torturados pela culpa e pelo remorso, não conseguem se beneficiar de sua conquista. A ação se passa na Escócia, por volta do de 1040.

SHAKESPEARE
A história de Macbeth, personagem da história escocesa, não corresponde bem àquela que temos na peça. Shakespeare, em grande parte, a adaptou ao gosto real da época, o do rei James I. Macbeth, ao voltar de uma batalha, com seu amigo Banquo, encontrou três bruxas que o informaram de que receberia a tutela de um território e o título a ela correspondente. Disseram-lhe mais as bruxas que ele acabaria assumindo o trono real, mas que dele não se beneficiaria. Tudo aconteceu como o profetizado pelas bruxas.

Personagem particularmente importante da peça de Shakespeare é Lady Macbeth, tida erroneamente por muitos críticos como secundária. Ela é, a rigor, por sua influência sobre o marido, um fator decisivo sobre o desenvolvimento da ação dramática. A história de Macbeth, numa leitura psicanalítica, freudiana, a melhor para entendê-la, nos relata uma das mais profundas verdades do psiquismo humano, ou seja, o desvelamento das causas psicológicas pelas quais uma pessoa, depois de ter obtido êxito, realizando o sonho de uma vida inteira, se perde, fracassa, pondo tudo a perder. 

FREUD
A história, pelo ótica freudiana, nos revela que muitas vezes, quando chegamos ao topo, no momento em que obtemos o desejado, começamos a perdê-lo por razões inexplicáveis. É o caso de Macbeth, de Lady Macbeth especialmente. Num estudo clássico, de leitura absolutamente indispensável, chamado Os Arruinados pelo Êxito, Freud nos revela que criamos graves problemas para nós mesmos quando se trata de usufruir plenamente a satisfação de nossos desejos realizados, mesmo no caso dos que são moral e eticamente aceitáveis. A realização de qualquer desejo traz sempre muita ansiedade, angústia, pois, ao buscá-lo, temos que nos dividir, trabalhamos sempre com a nossa incompletude, pois nos constituímos sempre através do desejo e da falta. A maior parte das pessoas não suporta isto. 


LADY   MACBETH   ( ISUZU YAMADA )

Naqueles que fracassam, quando obtêm “as coisas tão desejadas”, diz Freud, principalmente quando se lida com questões de ambição e de sucesso na vida, fazemos uma espécie de pacto com o demônio, isto é, com o nosso inconsciente, trazendo o inferno para dentro de nós. Não toleramos a nossa “felicidade”. Daí, em nosso dia-a-dia frases como “não tenho tempo”, “isso não é para mim”. Usamos dispositivos sabotadores que inconscientemente entram em nossas vidas para impedir o nosso “sucesso”, a nossa “felicidade”: falta de tempo, descontrole financeiro, falta de foco, múltiplos e dispersivos interesses, falta de atenção, os casos que criamos inexplicavelmente quando “tudo ia tão bem”, a nossa impaciência. 

Salve, Lady Macbeth!